quinta-feira, 16 de outubro de 2014

O "Pré-Sal" dentro de você....

Em todas as descrições que já fiz em relação aos treinos para um Ironman, esse apresenta duas novidades: leva em consideração que já realizei um IM esse ano, em Florianópolis e estou lidando com um mudança de padrão alimentar radical.

Os treinos seguem o roteiro de uma preparação para o IM, que pode ser dividido em quatro períodos.

O primeiro é basicamente um período de treinos livres que se iniciam entre 30 a sessenta dias depois do Ironman. Não há uma programação e o atleta escolhe os seus treinos.

O segundo período tem como objetivo concatenar a volta as atividades, mas de forma ainda leve. Há um longo de bike e treinos uma ou duas vezes por dia. A idéia é começar a religar o seu corpo.

O terceiro é o certamente o principal deles. Os treinos durante a semana são relativamente curtos (não confundir com "leves"), e os longos começam com uma natação de 3k na sexta-feira, de quatro a cinco horas de pedal no sábado ou um longo de corrida de 2:45 no domingo.

O quarto período, bem mais curto é o polimento. Fisicamente, não é "molezinha", mas  o duro mesmo é a parte psicológica. Como escrevi em outros posts, você se sente cansado durante a fase três e parece que não vai ter força para fazer a prova, só que quando chega o polimento a sensação é que você não deveria ter parado de treinar, que poderia ter feito mais e, de quebra, ainda está gordo.

Uma merda.... :-(

Convenhamos, não é um bicho papão quando se olha o quadro todo. Mas quem vê um pouco de longe, tira a média de um triatleta pelo pico de treinos que ele faz para um Ironman nessa última fase -  e a gente vive um pouco dessa fama de "homens de ferro" o ano todo.  ;-)

Embora muitos tenham conhecimento sobre esse período de preparação, vale dizer que o que mais impressiona não é tanto o volume no dia a dia, mas a capacidade de dar sequência a treinos curtos e longos com um fôlego só  - você faz um pedal de 150 km no sábado, corre coisa de 29 km no domingo e, segunda-feira....descansa? Não. Segunda-feira você pula na água as seis horas da matina, dá uma corrida leve a noite e na terça já começam treinos curtos e mais puxados na esteira, no rolo e na piscina até o próximo final de semana.

Eu já conheço essa rotina, mas a transição para a dieta Low-Carb me trouxe situações novas em que a experiência não ajuda tanto - e as vezes não há muito para quem apelar.

Se é possível dizer há uma tsunami de informações sobre a dieta para quem deseja, por exemplo, perder peso e mudar seus hábitos alimentares, no caso da prática esportiva ainda estamos longe do acúmulo de conhecimento nesse mesmo patamar - há apenas alguns poucos livros e blogs com depoimentos pessoais.

A gente vai tateando no escuro.

O grande interesse que essa dieta desperta para quem faz provas de longa distância tem a ver com o acesso aos estoques de energia que estão disponíveis no seu corpo.

Se fiz a lição de casa direito, as moléculas gordura carregam mais energia que os carboidratos em uma relação próxima a 2:1 (9 Kcal/g de energia contra 4 Kcal/g) e representam um reservatório de energia bem maior - os estoques de gordura disponíveis em nosso corpo podem prover 40.000 mil calorias contra 2.000 dos carboidratos.

Mais: segundo alguns autores, a cetose pode oferecer ao atleta desempenho físico melhor em dois aspectos: aumento da capacidade aeróbica e resistência muscular, o que seria particularmente importante em provas de endurance.

Entretanto, qual o caminho para acessar o "Pré-Sal" dessa fabulosa reserva energética?

Não conheço resposta diferente daquela dada pelo empirismo: adaptação.

As nuances se referem apenas a forma como essa adaptação pode ser provocada.

Alguns autores defendem uma combinação de estratégias de condicionamento fisiológico e alimentação sem que você seja obrigado a seguir uma dieta Low-Carb, como treinos em jejum ou exercícios fortes seguidos de atividade física moderada com algumas horas de intervalo sob condição de baixos estoques de carboidratos.

Para os que seguem a dieta, o acesso a essas reservas se dá em algumas etapas.

Nos primeiros dias há uma adaptação do seu corpo. É possível sentir dores de cabeça, fraqueza e um pouco de tontura. O efeitos são passageiros e duram, talvez, de dois a três dias.

Já do ponto da prática esportiva, a adaptação é mais demorada e a fase inicial desse processo é dura de lascar. Minha primeira semana de treinos foi a mais difícil entre todas que sou capaz de lembrar.

Aós quatro semanas após o inicio da dieta, minha condição já melhorou e me pus a testar algumas coisas  - consegui fazer dois longos de 5 horas de bike apenas com água e capsulas de sal e dois longos de 2:45 na mesma condição. Os dois treinos foram realizados com variação de ritmo constante (fácil+moderado/forte+forte).

Mas vale dizer que não dou pirueta sem rede de segurança - tinha um estoque de gel comigo e fique atento a todos os sinais do meu corpo.

Após esse esforço, ingeri uma bebida com carboidratos e proteínas na proporção 4 x 1 (aquela, você sabe) e uma colher de mel, pois é necessário recompor os estoques de glicogênio depletados após a atividade física. Essa recomposição não altera o estado de cetose (agradeço o esclarecimento ao Estevão Borges Jorge, do Grupo Running/Endurance Paleo Low Carb).

Até o momento, perdi medidas e não houve perda de massa muscular maior que aquele que experimentei em outros anos. Também não tive queda do sistema imunológico, cujo gatilho é uma herpes perto do lábio.

Mas, com tudo isso, é bem possível que eu faça a prova pagando o preço de uma adaptação que ainda não está completa. Algumas pessoas apontam que esse processo pode levar mais de três meses.

Mas o quê fazer durante a prova de Ironman tal como será Fortaleza?

Ainda estou coletando algumas informações para traçar a minha estratégia, que ficará para o próximo post.

É possível adiantar dois pontos: o primeiro, que está fora de questão a supressão completa dos carboidratos. Os treinos que fiz sem eles fazem parte do processo de adaptação - na prova a idéia é outra.

O segundo ponto é um pensamento do Peter Attia que não me sai da cabeça: mais importante do que você vai escolher para ingerir durante a prova é dieta antes dela, pois é nesse período que se constrói a chamada "eficiência enérgica" e o balanço de carboidratos e gordura ideal para você.

Se interpreto corretamente,  a necessidade de carboidratos não é uma aritmética abstrata entre o que é consumido e o que é gasto em calorias durante o tempo que dura o esforço físico em um Ironman - se isso estiver correto, as contas que fazemos na ponta do lápis na mesa da nutricionista são "chutes" podem superestimar nossa necessidade de carboidratos.

Confere produção?

Caminhando para os "finalmente", gostaria de guardar dois pontos.

O primeiro, é que esse relato não tem pretensão de ser uma cartilha para pessoas que pretendem fazer uma experiência desse gênero em provas de triathlon ou Ironman. O manejo de informações de saúde não devem ser objeto de publicidade, promoção pessoal e, portanto, consulte um profissional da área de nutrição que seja da sua confiança, seu técnico ou um médico antes de mexer uma agulha.

Bom, mas abre um parênteses aqui.

Os adeptos das dietas cetogênicas são céticos em relação ao trabalho de grande parte dos nutricionistas, muitos dos quais apenas repetem fórmulas derivadas de hábitos consagrados. Realmente, é frustrante quando se nota que muitos nutricionistas precisam de uma maior atualização em relação a temas novos, e não sabem rebater argumentos de pessoas que descobrem coisas sozinhas em sites especializados na Internet.

Eu sempre achei que valeria mais ser orientado por especialistas que estudaram quatro anos do que por pessoas que estudam o assunto por interesse próprio - mesmo aquelas com senso critico e inteligência aguçada.

Mas depois que descobri que o Rodrigo Constantino é realmente economista, escreve o que escreve e fala o que fala, achei que isso era uma bobagem....;-)

Falando sério...

Há camadas de complexidade sobre esse assunto e dificuldades adicionais quando não há familiaridade com os conceitos. Descobri textos que discutem a dinâmica da bioquímica humana nesse regime, mas são quase ininteligíveis para leigos ou exigem muita pesquisa para uma compreensão.

Nesse ponto é que se põe a nu os limites do autodidatismo.

Fecha o parênteses.

O segundo é que relatos pessoais tem a cara do dono e, por vezes, esse torce as palavras para que a situação pareça mais favorável do que ela realmente é. Por quê? Porque consciente ou inconscientemente ele deseja que a dieta dê certo e carrega o samba enredo apenas com as coisas positivas.

Vale sempre ser critico e desconfiado.

Afinal, isso aqui, não esqueçamos, é um Blog.



2 comentários:

Fe-SP disse...

Olá!
Você já usou manteiga de amendoim (pura, sem açucar ou até mesmo feita em casa) no pre-treino? Em teoria me parece ser uma boa, mas não sei até que ponto não daria uma sensação de "pesado", uma vez que geralmente corro em jejum.
Abraços
Fernanda

Anônimo disse...

A busca do auto conhecimento é isso; estudar, experimentar e saber ouvir e sentir o próprio corpo. Está no caminho certo e tenho certeza de que esse IM de Fortaleza vai ser surpreendente! Abç com carinho