segunda-feira, 27 de agosto de 2012

O sentimento do mundo....

Obviamente, dado o post anterior, esse texto não tá no clima de "suuuurprise!"

Antes de ir para Penha, eu realmente não estava no clima da prova.

As duas últimas semanas que antecederam a prova foram repletos de dias muito desgastantes e por várias vezes me achei em overtrainning.

Comentei sobre isso quando falei sobre as expectativas que tinha para a prova.

Na semana do polimento - lembrando que "polimento" no Ironguides é um período muito curtinho - mandei um email para o Rodrigo Tosta dizendo que realmente estava no meu limite mental.

Treinando duas vezes por dia, deixava os treinos de intensidade para fazer a noite. E creio que exagerei em alguns deles.

Consequentemente era difícil comer e muito mais ainda dormir depois disso.

Como havia outro treino logo pela manhã e o trabalho em seguida, em alguns dias eu empurrei os treinos para frente - porque sei que a ordem deles é importante e que não podia simplesmente inverter a seqüência.

Ele imediatamente me mandou parar. Tirar dois dias da última semana para fazer algo, menos pensar na prova ou em triathlon.

Ai a sensação se inverteu - de um pretenso estado de overtranning passei imediatamente para a sensação de que estava destreinado, gordo, cheio de dores musculares e apavorado com a possibilidade de sofrer.

Vou dizer uma coisa: é duro! :-)))))

Em que pese ser esse, acho eu, minha décima ou décima primeira prova na distância meio-ironaman, isso nunca tinha acontecido - pelo menos não desse jeito.

As coisas estavam complicadas e pensei que, se no IM do Texas eu estava bem e casa caiu, em Penha então....

Uma amiga com bem mais vivência que eu no ramo triatlético me escreveu o seguinte "é assim mesmo, quer dizer que você tá ficando no ponto".

Minha primeira reação foi "Tá me zuando essa mina, véio?" ;-)))

Não estava.

Depois de dois dias parados fui pra lá, pra Penha, na quinta-feira.

No avião encontro o Leonardo Santana, que conheci ano passado com a turma que veio do Nordeste. A gente pega o mesmo transporte e taca conversa para colocar o papo em dia.

Vou direto para a Expo, que esse ano estava menor ainda. Tinha ninguém, ninguém, ninguém.

Deixo a bicicleta com a moçada do Kona Bikes e cumprimento o Max, sentado no chão com um laptop.

Evito a tietagem de sempre, mas é um pouco inevitável comentar as matérias que eu gosto do Blog dele - disparado o melhor entre todos nós.

Arrumaram a bike na hora e fui para o Hotel.

E lá estava o Dalton Cabral, no quarto ao lado do meu.

Nosso encontramos no café da manhã e já vou tirando tudo que posso dele sobre natação. Eu e o Rodrigo Melo, que fica sempre nesse hotel.

E o Dalton é uma figuraça. O MundoTri fez um bem danado quando o escolheu para o Diário de um Ironman. Era muito divertido vê-lo timido, recebendo elogios de outros triatletas do Brasil inteiro que fizeram a prova e o reconheciam por conta do belissimo trabalho que ele fez.

E o cara é uma ótima companhia para as provas porque ele fica em uma "frequência diferente".

Putz, agora vai explicar o que é isso...

Sabe quando o sujeito fica "pilhado" pré-prova? Então, inverte. O Dalton é o "des-pilhado.

Um amazonense com índole bahiana. ;-)))))

É isso é uma atitude consciente. Ele simplesmente sabe como evitar desperdicio de energia - isso vai da economia de gestos, discussões agitadas ou estresse com horário para almoçar, pegar a bike, kit e por ai vai...

Mas não se engane: quando você vê aquele cara falando tranqüilamente, de forma pausada e sem movimentos exagerados, não imagina o que ele faz na prova.

Ai você entende o profundo significado daquela frase "Devagar também é pressa". ;-))))

Nesse meio tempo, a gente também deu de cara com o Wagner do Mundo Tri, o Pipo e o Luis Fernando, da All Distance - loja bacana aqui em São Paulo - e depois se juntou ao grupo o Artur Alvim - uma figuraçááááááá que tem o recorde da bolinha da USP! E não posso esquecer o Wlad, claro, que veio do Rio e chegou na quinta-feira a noite.

Aproveitando a deixa, também não posso deixar de citar o encontro que tive com o pessoal do Sul. Marlos, Aline e o Pablo Bravo.

O Pablo também tem um Blog, a gente se conhecia porque um lia o outro, mas nunca tivemos oportunidade de nos conhecermos pessoalmente.

E essas coisas são muito engraçadas; sei lá se sou eu que me dou muita intimidade (e não devia), mas a gente conversa e parece que se conhece a décadas!

Assim também foi com o Ricardo Saldanha, que nos foi apresentando pela Nilma, em uma mesa captaneada pela figura super simpática do Marinaldo Brito. Ricardo tem uma história no triathlon e contou um pouco dessa história pra gente.

Ele fez a prova com o dedo do pé quebrado e ainda tirou um quinto lugar na categoria.

No dia da prova, na área da transição, encontrei a Mariana Andrade, Lisandra e Ana Lidia. Depois encontrei mais gente...

Wagner Spadotto, Marlus, Luquinhas, Aline, Elionai, Lourenço...Nossa!

É, sei que que nem estava lá pode estar pensando. Só que gosto de lembrar a Deise Jancar dizendo que cada prova não se resume a um resultado, mas um encontro de amigos que a cada ano se agrega mais gente.

Perfeito.

Enfim, eu que sai de São Paulo cabisbaixo achando que ia ficar assistindo televisão o dia todo estava tendo uma ótima pré-prova. Bastou algumas horas para estar me sentindo em casa rodeado por amigos e pessoas bacanas.

Para variar perdi o fio da meada. Onde é que a gente estava mesmo???? :-)

Bem, na ante-vespera da prova, passei a noite em branco. Não dormi.

Eu não me sentia tenso, mas quem sabe o que rola no seu inconsciente?

No dia anterior, a gente fez tudo com calma e tocamos eu, Dalton e Wladimir para entregar as coisas na área de transição. Estava lá o Terenzzo Bonzoni, que me pareceu um cara super simpático, além do Chicão, Santiago.

Comemos um pizza a noite e fomos dormir. Ai como eu estava com o sono todo atrapalhado, apaguei.

No dia seguinte acordei bem e tocamos o barco para a prova.

Mas já na praia me bateu um certo nervosismo e meu coração dava umas disparadas.

Coisa que nunca aconteceu. Que creca era aquela?

Fui para fazer um aquecimento no mar e logo deu para notar que as ondas na entrada não estavam bolinho, não. Ai me lembrei do TB de Santos quando eu tentava entrar no mar e não conseguia - minha toca veio parar no dedão do pé de tanto caldo que tomei.

Dada a largada, o problema foi menor do que eu pensava. Na entrada as ondas não atrapalharam tanto.

Ai rolou o de sempre: foi tabefe pra cá, tabefe pra lá...enfim, coisa que todo mundo está acostumado - embora não devesse.

Sei lá quantas vezes vou escrever sobre isso, mas não me conforma o fato de que 99,9% das bofetadas que a gente toma na natação não são necessariamente involuntárias. Porque as pessoas insistem em jogar o braço em cima da gente sabendo que estamos lá e que não vai adiantar picas?

Não estava difícil localizar as bóias maiores, mas as menores eram da mesma cor das toucas.

Complicou um pouco...

Nadei o que deu para nadar - nem bem, nem mal. Acho que na casa de 34-35 minutos...

Só que quando estava cheeegaaaando na praia, veio uma onda e quebrou em cima de mim.

Foi uma chicotada daquelas para não esquecer - pior que a que tomei no Estadual do Rio!!!

Sei lá, acho que Netuno tem uma questão pessoal pendente para resolver comigo.

Instintivamente soltei o corpo para não lutar com a água. Mas ainda assim ela torceu minha lombar feio e bati o peito no chão. O rosto também, mas pouca coisa...

Dei um andadinha e percebi que não tinha me lesionado.

Ainda na areia deu vontade de olhar pra trás e dar uma banana para aquele mar fdp...;-)))

Fiz uma transição rápida. Colocaram uns meninos bons para puxar a roupa de borracha e eles estavam se divertindo com a brincadeira. Foi coisa de pit-stop de Fórmula 1.

Tudo bem que o meu pescoço quase foi junto com o wetsuit.

Sai para o pedal junto com o Clodoaldo, que estava forte e foi embora.

Eu resolvi segurar um pouco. Lembrei de uma conversa com o Dalton sobre uso de medidores de potência, principalmente quando ele me dizia sobre o desgaste que temos no inicio de uma prova ou de um treino quando começamos muito fortes e confiantes para terminarmos muito fracos e desgastados.

Decidi que tinha 90k para embalar e fiz um inicio conservador.

E nesse momento deu para notar bem como tem ciclista fazendo triathlon!!!

Alguns até um tanto que acima do peso, que pedalam forte (e pesado) na primeira parte da prova.

Se você notar bem, vai ver que aquele ótimo ciclista não está fazendo um pedal pensando em correr.

Ele está simplesmente dando tudo no pedal para ver o que acontece depois.

E se você tenta segui-lo está arriscando a sua prova. Aquela velocidade inicial não é realista.

Aquilo é blefe...

As vezes eles são ultrapassados, outras te ultrapassam e você fica preso em uma disputa de momento - uma disputa besta.

Se o seu treinamento foi consistente e você tem uma estratégia sólida, você vai ultrapassá-lo no último terço da prova ou antes, conforme o Dalton já tinha indicado.

E eu tinha treinado assim. O Rodrigo tinha me direcionado justamente para essa estratégia.

Mas o que percebo é a dificuldade de ser mentalmente disciplinado o suficiente para executar o que deve ser feito.

Manter o controle para não fazer a prova dos outros.

O Dalton tinha toda razão. Troquei a velocidade por um pedal mais consistente.

Como estava calor, não descuidei da hidratação. Também tomei BCAA e carbo a cada 45-50 minutos.

No geral as coisas deram certo e não me senti fraco.

Fechei o pedal para 2:35:20 minutos e muito mais inteiro que o ano passado - consequentemente fiz uma transição bem mais rápida (2:35).

E não tem coisa melhor que colocar o pé no chão e sentir as pernas soltas.

Vi o Dalton saindo para a corrida e tentei ser rápido para sair em perseguição.

E se estivéssemos em posição inversas, ele faria o mesmo.

Nós temos uma disputa de pace, uma disputa sadia em que "competimos" torcendo um pelo outro.

Ironbrothers, não Ironwar.

E continuei me sentindo muito bem. Os treinos longos com intensidade ou os progressivos do Rodrigo Tosta foram uma escolha perfeita.

Eu me sentia rápido, mas com a respiração controlada e sem problemas de estômago.

Aliás, eu me sentia como se estivesse nos treinos, mas fazendo tudo com uma intensidade maior.

Só que então...bem, então veio o vento. Vento, não! Um vendaval! Banheiros químicos voaram, algumas arvores caíram e foi necessário um reforço para a fixação das barracas.

Segundo alguns, próxima a área do Castelo, o pace diminuía entre 20 e 30 segundos.

Como corria para fazer abaixo de cinco horas, bem no último quilômetro temi que não fosse possíve!

E durante toda a prova eu tinha evitado olhar qualquer instrumento de medição - relógio, velocimetro ou medidor de cadência.

A vantagem é que não me perdi tal como ocorreu no Texas, quando ficava obcecado para manter com o tempo e acabei me dando mal.

Entrei no tapete que dava acesso ao pórtico, levantei a cabeça para olhar o relógio e ele marcava 4:57. Minha meia-maratona foi na casa de 1:40 baixo.

Eu não tinha noção da posição, que fiquei sabendo apenas tarde da noite: quinto na categoria e 78 no geral.

No outro dia encontrei o Dalton feliz da vida - ainda que tenha feito o mesmo tempo de 2011, ele passava da 52a colocação para a 13a na mesma prova.

Ao mesmo tempo o Wlad perguntava pelo FB se eu tinha comprado dólares.

Eu nem tinha pensado nisso!!!!

Ainda mais sabendo que o número de vagas na minha categoria havia diminuido de cinco para três.

Maaaasssssss....

Saimos eu e o Dalton atrás dos dólares e, com ajuda da Nilma, conseguimos comprar e fomos para o evento de rolagem das vagas.

O Dalton ficou como eu ano passado e por apenas duas vagas não conseguiu - mas ainda assim a gente estar ali na expectativa...

Pôxa, que avanço pra nós, sabe? Estar "na expectativa", sentir aquele frio na barriga, só isso já é uma coisa que deixa a gente feliz.

Na minha vez, eu teria que contar com duas desistências.

O Galvão chamou o Gondré, ele não estava lá.

Chamou o Luis Ondre.

Também não foi.

O Dalton imediatamente virou pra mim e disse eu tinha conseguido...

Fiquei totalmente zuretá!

Acho que eu falava com ele "Huuuuum? Como? Será? Não, vamos esperar..."

Pô, "vamos esperar"?????

O negócio era aritmética!!!!

Tem cinco vagas. Tirei o quinto. Os dois primeiros desistiram....

Portantoooooooo....

Só acreditei meeeesssssmoooooo, mas meeeessssmoooooo, quando o Galvão falou meu nome...

Subi as escadinhas com as pernas bambas. Ele me perguntou se eu era eu mesmo, mas eu mesmo não tinha tanta certeza se o "eu mesmo" era de fato eu mesmo.

Acho que respondi algo como Si...si-si..si-si-si...sisisisim.

Na minha frente, assinando a ficha, encontro o Ricardo Veras, um amigo que eu só falava virtualmente, mas é como comentei ai em cima - a gente tem a sensação de que conhece a décadas!

A gente se abraçava e ria com se fossemos dois meninos...

Sobre essa vaga, não há porque não dizer que foi um pouco de sorte, um pouco de oportunidade - que eu consegui aproveitar porque tinha treinado no meu limite e apareceu uma chance.

Sim. Porque existem amadores da minha faixa etária que disputam as provas em um nível inimaginável pra mim. Não há a mínima chance de andar com caras como o fantástico Phillipe Gondre ou Luis Fernando Odre, que abdicaram da vaga.

Estou longe de ser alguém excepcional.

Com isso estou querendo dizer: se você conseguir se doar e tiver um pouco de sorte em um dia especial, é possível!

Ao escrever esse relato espero construir um espelho para que outras pessoas que também não se julgam excepcionais, embora possam sê-lo em vários sentidos, possam reconhecer nele um pouco de si mesmas.

E ter esperança.

Porque julgo que é assim que funciona.

Os meus "espelhos" foram pessoas que me mostraram o caminho e ajudaram a construir as referências que tenho hoje.

O Edu "Três Meios" que um dia me apresentou esse esporte dizendo "Embora você não saiba o que é triathlon, preciso te informar que daqui a seis meses vamos fazer o TB aqui na USP"; cinco horas seria apenas uma abstração, um número, não fosse o Eduardo "PDF" Carvalho ter dito um dia que essa era uma barreira importante a ser quebrada em um telefonema para o Felipe Amante; ficar entre os dez da categoria eu trago de uma conversa com o Daniel Hamada, que uma vez me disse que ele esperava pelo menos uma vez ter a possibilidade de ficar entre os melhores da categoria; uma vaga para o mundial não passava pela minha cabeça até ver o Sandro Magalhães aguardando a rolagem do ano passado no mesmo 70.3.

Nesse sentido, o que me deixa feliz não é apenas meu nome em um papel dizendo que em setembro de 2013 poderei disputar um campeonato mundial.

O que me deixa contente é que trago comigo algo que não consigo expressar por minhas próprias palavras, senão por meio dos versos do Drummond que dizem:

"Tenho apenas duas mãos
e o sentimento do mundo".


domingo, 19 de agosto de 2012

O Déjà Vú do 70.3 de Penha vem ai...

Uma coisa boa de se manter um diário no formato de Blog é que você aos poucos vai acumulando informação e tecendo a sua própria linha do tempo.

Nessa perspectiva, fui consultar as minhas perspetivas de Penha do ano passado. O que escrevi foi

"Depois do Iron, eu e o Rodrigo fizemos alguns planos. Pensei em Cozumel, mas na cabeça do coach eu deveria aproveitar o segundo semestres para consolidar minha velocidade e participar de provas de triathlon olmpico ou meio-ironman. Começamos os treinos com foco em intensidade na corrida e um pouco mais de atenção à natação - eu não nado mal, mas me falta um pouco de agressividade na água..."

Esse ano também pensei em Cozumel, até porque o Caio e o Luizinho vão pra lá, mas me faltou coragem de encarar mais uma viagem ao exterior e optei por uma solução caseira.

E as questões na natação continuam as mesmas. Na corrida, também.

Até o cara que vai me pegar no aeroporto é o mesmo. Levo minha bike para o time do Max montar como sempre...

O Hotel é idêntico ao do ano passado.

E Penha também não deve ter muda nada...

Enfim, alguém não entendeu o título do post? :-))))

Não, há coisas diferentes, sim...

Diferente de 2011, esse ano não me lesionei e ainda fiquei um tanto mais magro.

Esse ano também fiz mais treinos fora do rolo no final de semana e insisti mais no Riacho.

Ano passado minha ambição era apenas tentar completar a prova. Esse ano, se puder ousar querer tirar apenas cinco minutos em relação ao ano passado e fazer um 70.3 em menos de cinco horas - plano que tracei com o Rodrigo quando ele veio a São Paulo e a gente conversou a respeito.

E ele fez uma programação de treinamento que consegui seguir quase a risca - não fossem algumas poucas vezes em que me senti cansado.

O Rodrigo introduziu natação durante todos os dias e todas as outras modalidades a noite. Mas meus dias criticos eram as terças, com um treino de rolo de quase duas horas, as quarta-feiras, com uma corrida de 17k e quinta pela manhã com um treino que incluia dois "tiros"de 500 metros na piscina.

No final de semana, as quatro horas de bike no Riacho, sendo a última em Time Trial foram um desafio a parte - porque você soma o desgaste mental do endurance com o desgaste fisico de ter que fazer força quando você tá cansado de fazer tanta força.

Claro, tudo isso entremeado por treinos mais curtos de natação ou corrida leve - que foi o que me salvou mentalmente.

Falo assim porque não tive lesões ou dores musculares. Não me senti "cansado" fisicamente.

Pra mim toda a dificuldade é mental. Quando eu bato os olhos na planilha e vejo que o exercício pede esforço "FORTE" ou "Máximo" eu fico de bode.

Prefiro correr duas horas e dar dois tiros de 500 metros na piscina - coisa que dura só uns 17 minutos.

E isso pra mim é coisa tão pouco comentada....

Já escrevi alguma vezes, mas vale sempre insistir: a gente fala pelos cotovelos sobre pisada, tênis, bike, rolo, capacete, suplementos....

Mas pra mim isso faz tão pouca diferença...

Eu sou daqueles que acreditam que qualquer um que tenha condicionamento pra tanto, pode fazer um pedal de cinco horas no Iron com uma bike de alumínio; pode correr em 2:00 ou 1:30 a meia maratona do 70.3 que o tênis não vai fazer a mínima diferença.

O que faz a porcaria da diferença é você conseguir o que os caras chamam de "mental fitness" - em outras palavras, é a capacidade de você tem de lidar com a dor para cumprir as metas colocadas para os seus treinos de forma a que se possa realmente evoluir.

Vencer a barreira da dor é uma coisa muito discutida no triathlon tal como em todo esporte de endurance.

Mas como "coragem" não é vendida em prateleira de loja, as revistas não podem anunciar e faturar em cima. Consequentemente, isso merece apenas um tiquinho de atenção de todo mundo.

Mas, vá lá....

É bem conhecido a filosofia de treinos do Brett Sutton, que tem como foco levar o atleta ao limite da exaustão, de forma a levá-lo a conhecer e irromper todas barreiras sobre seus limites - não importa, comentam os mais críticos com uma certa ironia...não importa o número de atletas que ele quebre nesse processo.

No Ironguides é bem conhecido um texto do Vinnie Santana em que ele comenta que a construção de uma base consistente é coisa de longo prazo, de forma que cada treino impacte no seu corpo de forma a que se forme um "calo" - uma abordagem mais agressiva, por outro lado, pode deixar cicatrizes, físicas ou mentais.

Por isso no processo de preparação para o Iron, uma das partes mais importantes da periodização é o tempo que se dedica a "aprender a durar", isto é, ao condicionar seu corpo para as rotinas desgastantes dos treinos que virão pela frente.

Mas existe um momento que mudanças de patamar exigem maiores desafios e o processo de treinamento muda de intensidade. Seja qual for sua escola de treinamento, se você quiser resultados melhores terá que abandonar a zona do desconforto e adentrar a zona da dor.

Aí manú, a coisa pega....

Na minha opinião, abstraindo-se toda e qualquer discussão sobre a habilidades naturais que certos indivíduos têm para suportar a dor, creio que a força mental para lidar com ela explica porque vários indivíduos possam, se bem treinados, cruzar o pórtico de um ironman, mas poucos podem fazê-lo abaixo de dez ou nove horas.

Talvez varias pessoas possam administrar essa dor em treinos, mas falham justamente no momento que deveriam construir seus resultados, que é o momento da prova. Isso também poderia ser uma fraqueza psicológica, ou seja, a falta de capacidade que as pessoas tem para lidar com as cobranças ou a pressão por resultados que elas mesmas se impõe.

Por vezes eu acho o assunto até mais prosaico, mas derruba muita gente a falta de jogo de cintura pela lidar com imprevistos. Não é falta de preparo mental também quando certos indivíduos se deixam levar pelo estresse quando pequenos detalhes que antecedem um evento saem do planejado? Tal como esquecimento de um gel ou o simples ritual do café da manhã não foi exatamente como tinha se pensado?

A capacidade que essas pessoas tem de se manterem focadas a despeito de toda e qualquer alteração no ambiente, de todo e qualquer improviso que seja necessário fazer, é umavantagem competitiva das boas....

Mas o meu problema nunca foram as provas.

No meu caso em particular me mata a execução de exercicios de intensidade - e justamente agora que sei que mais preciso deles. Quem me vê treinando sabe que quando se pede "vai pra morte" eu vou pra morte. Porque eu não tenho medo.

E por quê medo? Porque o medo da intensidade pode estar associado ao medo inconsciente de sofrer alguma seqüela. Algumas pessoas, por exemplo, tem receio de problemas cardíacos, enquanto outras de se exporem em um ambiente hostil, como nadar no mar.

Todos esses medos são "tratáveis".

Só que tem mais. A coisa é um pouco mais complicada que isso....

Meu problema é que isso tem um custo mental que me deixa mal.

E lidar com isso é uma coisa angustiante pra mim.

Segundo quem é bamba no assunto, existem coisas que podem ser "treinadas" para que uma pessoa consiga assimilar a dor. Mas existe um nivel de entrega e sacrificio do indivíduo que é apenas e tão somente dele.

Essa entrega nem seria uma questao de " forca mental", mas de um elemento muito subjetivo associado aos "demonios internos" que cada uma carrega consigo.

Enquanto alguns tentam apenas "não falhar", outros põe a faca nos dentes e vão atrás de resultados.

Pessoas que lidaram com traumas pessoais associadas a doenças graves, tiveram uma juventude muito complicada ou gostam da adrenalina das atividades de alto risco são providas de motivações que não são passíveis de serem "aprendidas" ou passadas de um indivíduo para outro por meio de algum manual.

Por isso gente, desculpa aí, viu? Mas deixa eu falar...

Por isso aqueles livrinhos de auto-ajuda muito que do tico-tico fubá são uma perda de tempo e pior ainda aquelas frases motivacionais que entopem todo dia a pagina do Facebook - em que pese a Siri Lindley, uma das melhores treinadoras da atualidade e de quem leio tudo que se publica, ser umas das maiores responsáveis por isso....

Mas a vida é assim mesmo, fazer o quê???

Elas por elas, melhor você ouvir ela do que eu...:-)))