quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Minha mão esquerda….

Nesse final de semana passado o Ironguides promoveu um Training Camp coordenado pelo Rodrigo Tosta na cidade de Rio Preto, Minas Gerais.

Para quem nunca ouviu falar, trata-se de um período em que pessoas ficam imersos fazendo treinos específicos, ouvindo palestras ou mesmo interagindo e se socializando com outros atletas da mesma assessoria.

No caso da Ironguides, que é uma assessoria que funciona com treinamento a distância, era uma oportunidade diferenciada.

O Rodrigo nunca me viu treinar, por exemplo.

Sei que há pessoas que ficam "meio assim" com um métodos de trabalho baseado no envio de planilhas e dúvidas tiradas por email. Quando a pessoa tem um perfil mais voltado para treinamento em grupo ou aprecia o técnico sempre ao lado, parece que mais difícil ainda entender.

O problema é que as vezes as coisas não são o que parecem ser.

Eu conheço assessorias em São Paulo cujos técnicos fazem atendimento personalizado não importa o número pessoas que eles treinam e poderia passar horas falando bem dos caras que estão a frente delas.

Mas conheço outras em que o indivíduo vai pelo nome do técnico que escreve em revistas ou sites especializados e, chegando lá, quem dá treino mesmo é o sócio ou o assistente, enquanto o bonitão só fica com o filé dos endinheirados ou quem tem status.

(Embora, diga-se, as vezes o caboclo é melhor que o dono e você sai ganhando na troca.)

Acho que tudo depende do perfil do atleta e do domínio que ele tem dos fundamentos do esporte que escolheu.

No meu caso, a coisa funciona bem porque gosto de treinar sozinho, fazer meus horários e o convívio social dos amigos da USP ou no Riacho Grande não depende da assessoria em que treinamos.

Mas aqui também não vou fazer uma defesa cega do coach on line porque não coloquei meu senso critico para dormir.

Foi nesse Camp que eu tomei consciência da necessidade do coach observar você para a correção de rumos.

Sim, isso é necessário e eu estava errado por pensar de modo diferente tempos atrás. Hoje reconheço.

No meu caso em especial, o Rodrigo estava curioso para observar a minha natação, já que os tempos que lhe passo para a piscina não são coerentes com o resultados das provas.

De fato, eu tenho um problema de navegação. Com o GPS observo que nado em zigue-zague e sempre contabilizo mais metros que o necessário para completar a natação.

Depois de Vegas estou nadando praticamente todos os dias tentando melhorar isso.

Mas no Camp o Rodrigo encontrou um problema na minha técnica, particularmente na entrada da mão esquerda na água.

Eu nunca tinha me visto nadando ou mesmo tirado fotos, tais como vários amigos já fizeram - Xampa, Curado ou o Alexandre, só para falar de alguns que me recordo no momento.

Eu realmente gostei de ter feito isso e visto o resultado.

Observe nesse video minha última braçada com a mão esquerda. É um pouco sutil, mas quando você nota é bem claro que o meu braço esquerdo "varre"a superfície da água quando me preparo para respirar.




Veja na figura abaixo a conseqüência: o braço esticado fazendo uma barreira e contendo a impulsão feita pelo braço direito, que está submerso.




Por outro ângulo.



Agora, com o movimento corrigido em quase todas as braçadas.



Para acertar esse movimento, tenho que forçar a entrada com a mão apontando para o fundo da piscina.

Embora pareça natural fácil, não sinto dessa forma. Ao fazer a entrada corretamente, me sinto desconfortável.

E esssa falta de espontaneidade é uma claro sinal que o movimento correto não está encaixado na maneira como nado e que facilmente volto ao errar se não me policio.

Mas quando isso acontece perco a espontaneidade.

Por isso,  quando está corrigindo a técnica, é esperado que você piore antes de melhorar.

Isso é natural e demanda paciência.

Dai a prática repetitiva ser fundamental - você deve praticar até o momento em que não pensa mais no que está fazendo.

É o oposto do aprendizado do jogo de xadrez, pois é um aprendizado mecânico, que se dá fora da consciência.

Para finalizar.

Certamente você já viu erros grosseiros de tenistas de nível mundial em momento decisivos  ou jogadores de futebol experientes perdendo pênaltis inacreditáveis em partidas importantes.

Esses erros podem ser debitados ao fato desses jogadores se preocuparem demais com a possibilidade de errar.

E ao se policiarem,  desabilitam o sistema espontâneo que permite o jogo rápido baseado no puro reflexo.

Usam a habilidade do jogadores de xadrez para executar um forehand.

Perde-se a fluidez natural, tal como os iniciantes caem de bicicleta.

Esse é o motivo dos erros parecerem tão toscos, pois se acentua o contraste entre a habilidade de jogadores exímios e a conclusão do lance.

Temos a sensação de que esses jogadores voltaram a ser principiantes.

Mas foi isso que de fato aconteceu.

Os lances erráticos dos grandes atletas e os caminhos da minha mão esquerda na água mostram as singularidades que compartilhamos, todos, por meio de uma mesma genealogia.

Ela nos unifica mais do que nos distancia.

É nossa grande identidade.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Fotografias....

Recentemente fiz uma incursão pelo Instragam. Curiosidade.

E já fui desconfiado.

Sempre que se fala em fotos me vem à mente o massacre dos albúns de casamento ou de festas de crianças. Aqueles que aparecem no seu colo quando você faz visitinhas sociais despretensiosas de "meia-hora".

É aquela adrenalina, sabe? :-(

E nem adianta mostrar interesse fingido porque não funciona.

A mulher senta do seu lado, bem pertinho, para fazer o papel de "comentarista".

E comenta mesmo.

Ai você educadamente meio que pula uma foto, mas ela percebe, pega na borda página e volta porque tem "um detalhe" na anterior que você precisa ver...

E tem gente que filma. Eu não sei se é pior...

Não, acho que é pior...

Porque só usando força fisica para pegar o controle remoto e colocar velocidade quatro.

Eu tenho problema com esse negócio de tirar foto. Têm os traumas da infância.

Sou de uma época em que se você era menino e tinha muitas primas na casa, como era o meu caso, foto pelado com tudo de fora é o que não falta.

De frente e com os braços pra cima.... :-(

Acho que é por isso que quando alguém pega uma câmera e diz "vamos tirar uma foto" eu faço cara de assustado...

Mas a despeito das brincadeiras, filmes ou álbuns de fotos resguardam parte dos nossos laços que, não fosse por eles, se perderiam fora da nossa memória para sempre. Nós temos vínculos com os momentos que deixamos para trás porque eles nos fazem lembrar de onde viemos e com quem estávamos.

Como dizia Walter Benjamin, as fotografias são dotadas de "aura", isto é, um objeto que nos dá a sensação de presença próxima de algo sempre muito distante.

Poucos no Instagram conseguem capturar esses laços emocionais no instante em que eles afloram. Um número menor ainda utiliza uma câmera pelo prazer de retratar a vida nas ruas, no transporte, nos parques tal como os pintores de paisagem faziam antes de câmeras fotográficas surgirem.

É uma pena.

Não dá para deixar de notar que uma parte significativa das pessoas fazem do Instagram uma boutique virtual para exibicionistas e voyeurs de photoshop.

Entre as coisa que me chamaram a atenção, estão as centenas de garotas mostrando o abdômen  no elevador, exibindo-se no espelho da academia ou fazendo caretas provocantes para elas mesmas.

Sou totalmente desavizado ou isso virou uma cultura?

Parece que montaram um esquema hierarquizado de autoflagelo.

No topo, as "garotas fitness" que mal disfarçam a intenção que de servirem de chamarizes para o mercado de assessorias de corrida, academias ou personal trainners. São mulheres que parecem desenhadas com a mão, embora pouco do que está sendo visto se explica unicamente por treinamento e o uso de anabolizantes é evidente nos traços masculinizados do rosto e coxas de jogadores de futebol.

Já a um degrau abaixo na evolução, estão as meninas um tanto mais mirradinhas que curtem tirar fotos na academia "levantando peso" ou correndo. É uma cadeia de egos alimentada por outras meninas muito parecidas e que transformam o Instagram repetição infinita de imagens, tal como um espelho colocado de frente para outro espelho.

Não vou particularizar.

Tem gente que dá como certo que essas meninas são aquele tipo manjado de "loiras ou morenas burrinhas de gosto duvidoso que posam com a bunda arrebitada e gostam de mostrar o braço definido e as costas largas porque são vazias e superficiais."

Não sei se é bem assim. Não dá para saber.

Porque entendo que existem aquelas que se dedicam ao corpo para mostrar disciplina e uma vontade inquebrável ou estão dispostas a mostrar alguma coisa que tem sentido para elas. Pode ser uma tentativa de perder peso, resgatar a auto-estima ou reconquistar a confiança depois de uma fase difícil na vida.

Mas por quê embrulham essas qualidades pessoais em um pacote que não reflete esse interior?

Que história as pessoas contam falando "da conquista" de gominhos na barriga?

A isso chamamos "lógica de açougue", para usar a feliz expressão de uma atleta fora do comum chamada Marília Coutinho. Se as meninas acham que "levantam peso" deveriam dar uma zoanhada no Blog dela.

Parece que as mulheres estão a procura de "serviços de oficina" para mudar partes do corpo que lhes parecem deficitárias em relação ao tipo ideal que vêem nesses modelos de parafina.

E são correspondidas por profissionais que repassam exercícios focalizados para remodelamento de nadegas, coxa, barriga - mas os tais profissionais que vendem esses serviços de funilaria são bastante comedidos em expor que essa remodelagem tem alcance extremamente limitado.

Como tudo parece uma questão de vontade, as pessoas que "falham" interiorizam a culpa por acharem que não se esforçaram o bastante.

Afinal, se "anything is possible", como poderia ser diferente?

Tenho lá minhas dúvidas se, ao invés de passarem uma mensagem de grande força de vontade, empenho e dedicação, essa lógica de esquartejamento não acaba servindo para alimentar os mais arraigados estereótipos que estão na base da educação sexual masculina - ou o pior lado dela.

Isso entre os homens.

Entre as mulheres fico pensando no efeito demonstração.

Quem vai adentrar a um mundo cuja porta de entrada é uma aterrorizante funil na qual só tem o ingresso meninas aparentemente perfeitas que parecem sair de uma propaganda de margarina?  Essa modelagem fake pode levantar comparações fora de contexto, dando a mulheres um sentimento de inferioridade e fracasso porque não reduzem o abdômen, eliminam a celulite ou apagam as estrias.

Sei lá.

Tenho duas sobrinhas e não gostaria que elas vissem o esporte ou a atividade física como meio para entrar na patota de habitues de shopping centers e de academias abarrotados de outras meninas produzidas por hormônios, dietas malucas e implantes precoces, sem falar nos transtornos psicológicos como depressão ou bulimia e nos desdobramentos negativos para a saúde reprodutiva delas.

Quando essa inflação de imagens têm algum sentido (muitas não têm), a intenção é mostrar aquela idéia radiante de felicidade aparente.

Mas no fundo a gente sabe que com as imagens até almas mortas podem parecer felizes.