terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

A sabedoria do "Meio Termo"

Essa semana comprei algumas revistas para ler no Carnaval. Pra quê?

Me deu nos nervos.

Sempre que aparece um tema polêmico, complexo ou de difícil resposta nas nossas discussões mundo afora, sacamos do colete respostas prontas que sempre soam como a solução ideal para qualquer discussão, não importa qual.

"Você precisa ouvir o seu corpo".

"Descanso também é treino".

"Cada um é um..."(sic!)

"O corpo manda sinais"

Esse conjunto de apetrechos de retórica pronta é de grande utilidade e anda muito em voga em colunas de "experts" que mandam brasa em revistas especializadas.

Aliás, abre parênteses:

Por quê essa Revistas não mandam para o espaço esses figurões, donos de assessorias de boutique, que já prestaram serviços a nação, mas abdicaram de pensar e agora vivem de falar obviedades para entupir o bolso de dinheiro?

Por quê não colocam pra escrever esses meninos que saem da faculdade, estudam e fazem pesquisa para arejar um pouco as idéias ou dão uma chance para esses caras de assessorias menores, que tem experiência e estão mostrando serviço já faz tempo?

"Pesquisa" em Revista assim, tirando as exceções de sempre, aparece em box apenas quando, mesmo sendo inútil, desperta alguma curiosidade, tal como "Estudo realizado na Universidade X aponta que os indivíduos que dão dez cambalhotas e roem as unhas do dedão do pé antes de correr apresentam 78,6% mais probabilidade de se lesionarem do que aqueles que não dão cambalhotas e costumar freqüentar uma pedicure regularmente."

Agora, fecha parênteses.

Essa profusão respostas prontas nos desobriga de pensar e nos dá a (falsa) sensação de segurança.

Porque quando são utilizadas em debates de idéias, parecem tão consensuais que são capazes de resolver conflitos, já que são verdades aparentemente tão acachapantes que ninguém precisa discutir o assunto.

Vai discutir com alguém que "você tem que ouvir o seu corpo"? Vão te chamar de doido.

Ultimamente, sei lá porque, ando de implicação com outra idéia que me atormenta até em sonho: "Equilíbrio".

"Equilibrio" é o mantra da "sabedoria do meio termo" e que virou recurso muito comum por técnicos de assessorias que usam e abusam do senso comum para dizerem o que a minha mãe, a mãe da minha mãe e a avó da mãe da minha mãe já diziam sem ter faculdade, isto é, "Nem tanto ao céu, nem tanto a terra".

Tudo bem que basta você por o pé na rua e adentrar a uma sociedade completamente neurótica, histérica, compulsiva, predatória e tão consumista em que até o "bem-estar" virou mercadoria de prateleira para notar que não resolve muito ser "equilibrado" se o resto do mundo não é.

Essa coisa de "Equilíbrio" é bonita nos livros de auto-ajuda de quinta categoria do Paulo Coelho.

Porque ler Paulo Coelho é bico! Difícil é ler literatura portuguesa (ou inglesa, francesa...) de qualidade.

Conseqüência disso é como pipocam "pensamentos" nas chamadas redes sociais. Na grande maioria dos casos, são atribuídos a autores que nunca escreveram necas daquilo.

É punk a gente ver frase de um anônimo-mané-qualquer atribuída ao Mario Quintana no facebook.

Pô gente, nós encaramos ironman, maratonas, ultramaratonas que são das coisas mais difíceis nesse planeta, mas alimentamos nossa massa cinzenta com literatura de, digamos, "qualidade discutível"?

Tudo bem, não precisa ler "O Guarani" do José do Alencar.

Mas sua bike vale 20 paus e você não pegou na mão sequer uma Antologia Poética do Carlos Drummond de Andrade?

Só conhece "E agora José" porque viu o Cid Moreira declamar o poema no Fantástico? :-((((

Cacilds!!!!!

Mas, espera....

Tô com a sensação que queimei meu filme....

E não fui muito justo porque generalizei, né?

Verdade.

Aliás, nem sei porque desembestei a falar sobre esse assunto...

Voltando ao assunto "equilíbrio".

Como esse blog é de triathlon, vou me arriscar a dizer o seguinte: se você escolheu fazer esse esporte e se dedicar a ele...bom, então "equilíbrio" é tudo que você não vai achar aqui.

Do ponto de vista do nosso "estilo de vida", é fácil ver que nossa relação com os compromissos familiares e profissionais ficam totalmente embaralhada.

Não "embaralhada" no sentido de que não há uma ordem

Ordem há.

O problema é que essa ordem distoa de 99,9% dos humanos que levam suas vidas de forma rotineira e socialmente aceitável - e entre esses está a sua família, seus amigos e o povo que trabalha contigo.

E tentar ajustar todas as engrenagens é coisa de louco.

Mas sempre surge alguém com aquela sabedoria de botequim e lhe diz "você precisa encontrar um "equilíbrio".

Naturalmente, isso me estressa mais ainda e o "alguém", logo percebendo que vou chutar o balde (e algo mais), arremata:

"Tá vendo como tô com a razão?? A gente quer ajudar e você fica todo descompensado!"

HÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁ.... ;-)))))

Bom, a forma como eu encaro o assunto é o seguinte: ao invés de ficar pensando em correr de um lado para outro como se fosse aquele malabarista chinês que equilibra pratos em espeto de bambú, já sou tão pragmático que admito que alguns pratos vão pro chão.

As vezes (não todo dia, não toda hora) eu simplesmente me pergunto da forma mais realista possível "onde é que vou perder menos?"

Por isso que esse esporte serve para nos amadurecer. Porque se faz escolhas e se lida com elas.

Sim, porque ao escolher algo, outras coisas deixam de ter prioridade. E apenas meninos mimados acham que podem ter tudo e tudo ao mesmo tempo.

Como dizia Pete Tosh "Everybody wants to go to heaven, but nobody wants to die".

(Se é que essa frase é dele...;-)))))

9 comentários:

simplifique disse...

Bessa,
Concordo com o lance da assessoria de botique. ja vi o cara falando e e assustador.
Em relaçao ao meio termo, acho q e possivel equilibrar sim.
Mas, tudo vai depender do que voce quer. eu busco no esporte um caminho saudavel e acho que e possivel.
acho q atde um olimpico o caminho parece equilibrado, mas dai pra frente o troco desanda.
Agora, com dois filhos e uma pequena em casa terei q alterar a minha rotina de treinos e vai ser complicado, pq mudar rotina e foda.
Tinha umas ideias para esse ano, mas acho q vou por a viola no saco. pode ser cedo, mas e uma percepcao.

Emiltri disse...

Vagnão,

Quanto a crítica às revistas você sabe, o grosso dos leitores, a média, é feita de quase atletas que mais querem aparecer ou se superar do que realmente ter um novo estilo de vida. Aí a revista tem que vender o que eles querem ouvir... e o brasileiro não é muito conhecido por ler e ouvir coisas de boa qualidade ou coisas desafiadoras.

Você está rumando para o topo.

Equilibrio significa média, e média significa média mesmo. Quanto mais nos aproximamos dela, mais longe dos picos ficamos. Como o Xampa disse, alguns de nós procuramos mesmo isso, acho que ultimamente eu também... e eu diria que você em um passado não muito remoto também. Mas agora você sacudiu mesmo!

Abrax.

Guilherme F Gardelin disse...

Caro Vagner, com todo respeito, ouso discordar de algumas conclusões em seu texto.
Quanto à qualidade das revistas e similares, assino embaixo, só servem para ficar no banheiro para se ver figurinhas enquanto se "medita".
Porém, sou da opinião de que não se trata propriamente de equilibrio, mas de (se botar) qualidade naquilo que se faz.
Eu acho que dá para treinar todos os dias, trabalhar, dedicar tempo à mulher e as filhos, descansar, tomar um goró de vez em quando (de preferencia um vinhozinho ou uma Serra Malte bem gelada) com os amigos de fora do triathlon, ir ao cinema, ler um bom livro etc.
Se se colocar qualidade e energia em cada uma destas atividades, dá para tirar de letra.
O problema é que as vezes misturamos quantidade com qualidade (ou vice-versa).
Passar o dia todo com os filhos, mas checando o blackberry para ver e responder novos emails, assistindo televisão e respondendo monossilabicamente às perguntas dos pequenos, dizer que "tá, tá, daqui a pouco o papai chuta uma bola (ou empina a pipa, ou pula corda, etc etc) com vc, agora não dá", isso é quantidade, mas está longe d ser qualidade.
Assim penso que os treinos também são. Mais vale 100k bem feitos na magrela, trabalhando na potencia certa (para quem usa MP), correr esta ou aquela distância ouvindo bem o coração e reconhecendo a passada certa, e assim por diante, pode não ser o ideal para um verdadeiro candidato a conquistar uma vaga para Kona, mas para a maioria dos mortais, acho que resolve.
Quanto ao chines equilibrista, é isso aí, na vida não há como se evitar a quebra de alguns pratos, mas talvez a sabedoria esteja em saber quais pratos podem ser quebrados, quais devem ser protegidos para sempre.
Pelo que leio no seu blog, vc está melhorando o seu rendimento como atleta. Isto é ótimo.
Quanto aos pratos, vc saberá quais podem se quebrar...
Um abraço,
Guilherme

Antonio C R Colucci disse...

"Estudo realizado na Universidade X aponta que os indivíduos que dão dez cambalhotas e roem as unhas do dedão do pé antes de correr apresentam 78,6% mais probabilidade de se lesionarem do que aqueles que não dão cambalhotas e costumar freqüentar uma pedicure regularmente."

CadÊ olink para eu responder essa enquete? hehe

Muito bom o post, como sempre!

Abraço
Colucci
@antoniocolucci

Claudia disse...

Muito bom, Vagner!!! Concordo com voce: a grande maioria dos textos das revistas especializadas são descartáveis, superficiais e mal escritos.
Ah, e, puxa, achei que eu era a única neurótica compulsiva obsessiva que se incomoda com citações atribuídas aos autores errados. Pobre Saramago, coitada da Clarice...
Quanto ao equilíbrio... Penso que não é uma estado estático, nem permanente. Sei lá, mas acho que é como andar de bike - se tiver rodando, vc não cai!!

Joel dos Santos Leitão disse...

Sabe, Vagner, eu tava pensando justamente sobre isso nesses dias. Tô falando da leitura fácil, ou até da falta dela.
A grande maioria dos atletas amadores que conhecemos é oriunda das redes sociais, e evidentemente que não há vida inteligente nas redes sociais, porque até as pessoas que sabemos que são inteligentes acabam de uma forma ou de outra se nivelando por baixo.
Tô quase virando um ermitão depois de cair fora do Orkut, Facebook e Twitter. Só falta agora o Linkedin, que não cheira nem fede... porque quase não uso.
Também não acredito no equilíbrio. Sempre deixaremos algo em detrimento de outro algo, e quanto mais a atividade física vai virando estilo de vida isso acaba sendo um desiquilíbrio em relação à vida que a maioria das pessoas leva.
Discordo que dá para tomar o vinho e a cerveja de vez em quando. Não dá. Aliás, se quiser tomar o vinho ou a cerveja terá que ser beeeeem de vez em quando. E isso é a exceção da exceção, a ponto de não participar de convites onde a bebedeira corre solta, ou ir lá sabendo que ficaremos à base de água. Se não for assim, não há competitividade nem um bom desempenho. Álcool e comida trash são antagônicos para quem quer adotar um novo estilo de vida, compatível com o Triatlon, Ironman e Ultramaratona.
Quanto às revistas ditas especializadas, não seja tão exagerado. São melhores que a Veja...

Max disse...

Vagner,

é esse filtro de informações que me fez declinar do seu convite e sair de (mais um) grupo de redes sociais. Para cada opinião sensata aparecem várias insensatas, e dia após dia isso vai cansando.

Não sou o dono da verdade mas ando meio sacudo das inverdades alheias e dos experts de plantão. Se for pra ler e ouvir besteira eu fico com a minha produção autônoma.

Abração e pode ter certeza que o seu blog continua sendo parada obrigatória.

ciro violin disse...

É...
Bom, falando primeiro das revistas, concordo plenamente.

Com a internet muita gente esta começando no esporte e muitos começam a falar e escrever como se tivessem capacidade e conhecimento para tal.
Como naquela música do Chorão do Charlie B. diz que existe gente que fala, fala mas nunca diz nada.

Veja pelo lado do assunto tênis minimalistas e pisadas, para se ter uma ideia to tamanho da merda que esta ocorrendo.

Agora.... acho que entendi o que vc quis dizer sobre o equilíbrio.

Acho que vc concorda com ele, sabe que é necessário, mas o que vc não curte, são as pessoas que começam a falar desenfreadamente sobre equilíbrio.
Parece que tudo e todos usam a palavra equilíbrio para encaixar no meio das frases triatleticas.
Exatamente como acontece com frases como: Triathlon é estilo de vida.
Parece que todos falam isso hj em dia, e a palavra equilíbrio entrou no meio.

Sobre leitura, eu não sou ninguém para falar nada, pois não consegui ler nenhum livro da literatura -boa- brasileira tipo Machado de Assis, por pura incompetência minha.

É foda, eu não sou ninguém para opinar sobre isso, mas tb não sei se é necessário ler esse tipo de literatura.

Sobre o que o Joel falou, concordo plenamente que sites como o facebook quase que te emburrece, pois tamanha é a imbecilidade das coisas que são escritas lá.

Mas pensando como ferramenta, acho que o face é ótimo!
Veja por ex o IronBrothes, sai bastante coisa boa lá e ótimos fóruns.
Basta selecionar.

É como TV.
TV é uma graaaaande merda quando falamos de Rede Bobo, ou Big Brother ou Datena.... mas quando vc seleciona o que vai ver, como History Channel, Discovery, e Net Geo, é possível aprender mil x mais do que na escola.

Não!!
Mil vezes mais não.

1 milhão de x mais

Outra coisa que o Joel falou foi: beber e treinar não dá.

Tenho que discordar quanto ao beber.
Quando se bebe equilibradamente (olha eu usando a palavra equilíbrio aí) acho que é MUITO BOM.

Tenho tomado Malzbier pelo menos 4x na semana. Uma ou duas long neck e é FANTASTICO!!!

Para mim a cerveja é um alimento muito bem feito.

É como sempre digo:
Defina a palavra -veneno- ?

Veneno é qualquer coisa que ultrapasse o DL 50, ou seja, qualquer coisa que ultrapasse a dose correta.
Se fizer demais se torna ruim.

Abs e desculpa escrever tanto

Artur Araujo disse...

Bom irmão eu só vou dizer uma coisa.Estufei o peito quando terminei de ler o post,pq realmente me senti um pouco mais inteligente.Olha sensacional,vc está cada dia melhor(vou melhorar isso)vc está escrevendo cada dia melhor e com opiniões bem formadas,convictas e principalmente sensatas.Vou parar por aqui,antes que eu emburreça de novo.Grande abraço irmão.