segunda-feira, 29 de agosto de 2011

70.3 em Penha 2011. O que foi, foi.

Ufá, ainda bem terminei o post anterior dizendo que "expectativas" valem a mesma coisa que nada...

Porque não valem mesmo.

Difícil explicar que, de uma prova para a qual eu me preparei para participar, resultado foi um PB com 18 minutos melhor que 2010.

Claro, mérito total dos profissionais que me ajudaram. Se eles me autorizarem, pretendo fazer uma lista com os emails deles e disponibilizar aqui no Blog.

Não ganhei todos os rounds - até perdi alguns. Mas faltou pouco, pouquissimo para um objetivo que persigo: fiquei a quatro minutos de um 70.3 sub-5 horas.

Há tempos, aqui mesmo nesse blog, eu dizia que minha idade me forçava a rever meus objetivos e manter o que já tinha conquistado - até bastante influenciado pela leitura do bom "Do que eu falo quando falo de corrida", do Haruki Murakami.

Por isso a minha "fuga para frente": ao invés de enfrentar logo os problemas que me impediam de ter resultados que queria, eu postergava isso fazendo provas duras a cada dois meses com o mesmo desempenho.

E minha desculpa era o VO2, era a o indice de massa corporal, era flexibilidade dos tendões...enfim, o rol de fatores limitantes posto na prateleira da ciência é grande.

Basta você ir no Supermercado das idéias prontas e escolher qual você quer comprar.

Depois, você acredita nelas, se acomoda, compra uns chinelinhos e um copo para colocar a dentadura...:-))))

Mas o triathlon é um esporte estranho. Ou talvez todos os esportes de endurance sejam.

Seria fácil eu dizer que a idade traz mais experiência, força mental e inteligência para compensar a desvantagem física que anos trazem.

Só que não é isso. Esse é um caminho fácil.

Há uma coisa que o Marc Becker falava sobre "reprogramação" que é muito interessante. Ele dizia que as pessoas não são escravas do seu biotipo, o "hardware", pois que o que conta mesmo é "software".

Como sou alto, quando as pessoas me veem, por exemplo, acham que minha estatura é ótima para corrida porque posso dar passadas largas.

Mas quando corro minhas passadas são curtissimas por conta do método de treinamento do Ironguides.

E depois de aprender a correr assim, passei a correr melhor ainda que mais velho (mas nem tanto, ok meninas, nem tanto....).

Então é possível melhorar, se tornar mais rápido e forte ao longo do tempo?

Minha experiência diz que sim (enquanto ficar "mais inteligente", diz que não! ;-))))

Tem coisas que não funcionam, claro.

Por exemplo, pra problemas de feiura como o meu ele não tem funcionado muito bem, não!

Eu já pedi uma planilha especial para o Rodrigo e estou esperando até agora...

Isso é um problema sério no Ironguides....:-)))))

Bom, como eu disse eu no post anterior, tinha alguns rounds para ganhar nessa prova.

O primeiro deles era em relação a natação. O Rodrigo me pediu uma saida forte, voo de cruzeiro e ataque as bóias. Seria estratégico fazer um bom aquecimento.

Cheguei com uma hora de antecidência, arrumei minhas coisas e fui para o mar fazer alguns tiros. Meu corpo se adaptou a temperatura da água e senti a musculatura mais aquecida depois das braçadas.

Fiz uma boa largada, não ventilei e consegui alguns espaços para nadar forte até as duas primeiras bóias. Infelizmente, não fui feliz em atacá-las porque fiquei no engarrafamento que sempre acontece para nadadores medianos como eu quando a gente chega nelas.

Mas usei essa tática de nadar forte quando me orientei pela bóia errada e tive que retornar ao trajeto mais curto. Gostei, pois rapidamente me recoloquei na natação para fechar em 33:22 (contra 37:24 de 2011).

O transição, que o Rodrigo me pediu para fazer em, no máximo, dois minutos, não consegui.

Meu wetsuit para tirar sozinho é o capeta! Ele enrosca no tornozelo e não sai! Se não tiver alguém para ajudar....Resultado da T1: 3:52 (4:56 em 2010).

Subi na bike com muito receio de me sentir exaurido logo de saida - afinal, os problemas de lombalgia e na panturilha não me deixaram treinar no Riacho Grande. Depois do Iron, fiz apenas dois treinos na rua - o resto foi rolo.

Mas, surpreendentemente, me sentindo bem, cheguei na primeira hora a 36 km/hora com a cara no vento. Lembrava do Chico me provocando: "eu arriscaria algo em torno de 35 km/hora".

Eu pensava "Hahahaha...sêo Chico, deixa eu te mostrar o meu tempo na bike...espera pra ver!"

E foi um belo pedal. Mas até um certo ponto...

Com uma cadência média em torno de 75 rpms, e com o vento ajudando nas subidas, eu me sentia "decolando" na primeira hora. Só que a partir dai, passei a sentir o desgaste e a média caiu para 35.5 km/hora e, faltando apenas 15 km para fechar os 90 km, quebrei!

Enfim, eu não estava com aquela bola toda e fui me arrastando....

Já tinha devorado tudo que tinha bike. Tivesse mais 10 km para fazer, eu tirava o capacete e comia...

Em função disso, média caiu para 34.7 km/hora fechando em 2:35:23 (em 2010, a velocidade média foi de 32,5 Km/hora e o tempo 2:45:50).

Apesar de não ter alcançado a média de 35 km/hora, depois fiquei sabendo pelo Landinho que pedalei perto do Sandro Magalhães quase o tempo todo. Bom, o Sandro, Artur e o Mota são os caras que admiro no pedal e chegar perto deles já me deixaria pra lá de feliz...

Cheguei e, ufá, bolo com coca-cola na transição! Dois tecos, um copo e tô novo!

O único problema é que demorei. A T2 custou 3:45 (pior que ano passado, que foi 3:03).

Na corrida...putz, eu estava com panturilha ruim, lembram?

Pois é, mas eu mesmo não lembrei!!!!

Sei lá, sai correndo totalmente revigorado e lá pelas tantas é que fui lembrar da panturilha.

Acho que a opinião da Janaina, dizendo que eu provavelmente eu só sentiria o esforço muscular e a aplicação do Kinésio Taping me deixaram mais seguro.

Isso sem dizer a adrenalina da própria prova.

Fiz a primeira perna para 54 minutos (foi a única vez que olhei o relógio), correndo com passadas curtas e um tanto na defensiva com medo de alguma quebra.

Ai, aproveitei para me descontrair e observar um pouco a corrida. E nas provas de triathlon tem umas histórias muito engraçadas, que as vezes a gente não nota porque está a mil....

Um cara, vendo o amigo andando, dá um BERRO de "incentivo".

Mas aquele BERRO...

"POOOOORÁÁÁÁÁÁÁÁÁ, VAMMMMMOOOOOOO LÁÁÁÁÁÁÁÁÁ CAR#@#@@HO!!!!!"

Acho que até uma vaca que estava pastando ali perto ficou assustada....

O cara, que chama Edinho e estava numa boa tomando gatorade, replicou apontando para o parque:

"Cara, o que é que tem? A gente vai chegar no mesmo lugar, só que você vai chegar antes...e eu, depois!"

Tem sentido, né? :-))))))

Bem, voltando...Tinha decidido que somente nos últimos 10,5Km puxaria para um moderado/forte - isso, "se" puxasse...

Em um dos retornos, avisto o Mota. Ele me diz "Estou te esperando...".

Pois é, "estou te esperando" nessas provas é coisa de uma ponte Rio-Niterói....

Faltando 6 km, emparelhamos e disse para ele "Mota, isso não é natural, você sabe. Não tem cabimente eu te passar. Isso é uma aberração..."

Ele comentou "Tudo bem. Você não tem idéia da força que estou fazendo para correr".

Repliquei dizendo que ele tinha feito coisas bem mais extenuantes como atleta e profissional e que, mesmo assim, nunca tinha cedido em nada.

Ele cresceu e começou a imprimir um pace forte. Fomos passando dezenas de pessoas e, pelo que me lembre, a partir desse ponto apenas me recordo do Roger Melo ter nos ultrapassado.

Antes abre parênteses

Isso fora o Marlus e o Dalton, que já tinham dado na minha cabeça antes, muito provavelmente a pedido da Cintia, que não estava lá mas mandou os dois para eu não esquecer "quem é que manda"....:-)

Fecha parênteses

Sem dúvida, foi o melhor momento do ano que tive no triathlon.

Nós não estávamos "disputando", não era um "Ironwar".

Eram duas pessoas correndo forte, uma buscando energia no ritmo da outra.

No momento em que fraquejei, ele aliviou dois passos, "me buscou" e voltei ao pace.

Pessoas assim podem ser solidárias, sem se servirem do outro em formas desleais de competição.

O "vácuo" ou a "esteira" que oferecem aos companheiros é moral.

Mesmo sem colocar o pé no chão para correr durante quase 45 dias, fechei os 21 km para 1:47:47 (contra 1:51:36 em 2010)

Terminamos a prova juntos em 5:04 e bati meu tempo de 2010 (5:22).

Não ganhei o Oscar, mas se eu tirasse da manga uma carta de agradecimentos, não poderia deixar de citar o Fabiano Bispo, Janaina, Chico e o Rodrigo Tosta.

E, como a Deise sempre diz, grandes competições só são "grandes" se forem lembradas como um (re)encontro de amigos.

Não fosse a oportunidade de rever a Lisandra, Mariana, Artur, Nilma, Ana Lidia, Landinho, Joka, Zé, Jorge, Ricardo, Wlad, Kiko, Renato, ainda tive felicidades de fazer outras grandes amizades: Leila, Roger, Caroline, Renata, Zé Delena, Thiago, Lourenço, Rodrigo, Renato, Fábio.

E, Edinho, se você algum dia ler esse post, fique sabendo que você também é do grupo de pessoas inesquecíveis dessa prova!

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

70.3 em Penha 2011. O que será, será.

Depois do Iron, eu e o Rodrigo fizemos alguns planos. Pensei em Cozumel, mas na cabeça do coach eu deveria aproveitar o segundo semestre para consolidar minha velocidade e participar de provas de triathlon olimpico ou meio-ironman.

Começamos os treinos com foco em intensidade na corrida e um pouco mais de atenção a natação - eu não nado mal, mas me falta um pouco de agressividade na água. Sou demais acomodado.

Eu realmente estava me sentindo ótimo. Meus treinos de corrida depois do Iron estavam me surpreendendo.

Mas, no meio de uma sessão de tiros na esteira, tive uma lesão na panturilha em meados de julho.

Ao invés de procurar um médico imediatamente, fiquei esperando para ver o que ia dar.

E deu que me dei mal...

Fiquei duas semanas brigando com a lesão. Quando fui ao médico, no começo da terceira, ele me disse "não foi grave, mas a cicatrização está no tempo limite para fazer a prova. Pode ser que dê para você correr, mas pode ser também que não seja possível".

Como me escreveu o Chico, "lesão é lesão", o tempo de recuperaçao não muda muito pois as fibras (ou poucas fibras, no caso das pequenas lesoes) que sofreram lesao, levam o mesmo tempo pra se recuperar. Em outras palavras, se houve um estiramento, as poucas fibras estiradas ou as muitas fibras estiradas levarão o mesmo tempo pra se recuperar. O que muda sao os sintomas pois se sao poucas, quase nao sentimos nada mas se sao muitas aí o bicho pega."

Nesse meio tempo, assisti, acho que na Globo, uma matéria um boxeador brasileiro que chegava a semifinal dos Jogos Militares na sua categoria sem ter feito nenhuma luta. Os adversários não conseguiam alcançar o peso e iam sendo eliminados em cascata.

A matéria era uma situação armada para fazer humor a custas de alguém e tinha lá um certo grau de crueldade.

Estava implicito "pode ser campeão sem ganhar de ninguém".

Quando foi perguntado o que aconteceria se ganhasse o título sem lutar, longe de aparentar qualquer constrangimento, o rapaz dizia mais ou menos assim:

"Como "sem lutar"? Alcançar o peso para estar na categoria é o primeiro requisito para subir no ring. Se os meus adversários não conseguem ao menos isso, como vão querer lutar? Eu estou aqui..."

Bom, vendo aquilo me senti um menino mimado de apartamento, morrendo de dó de mim mesmo.

Meus planos foram por água abaixo, mas eu tinha uma "luta" para fazer.

Claro, meus objetivos passaram a ser outros - antes de tudo, estar em Penha para a prova.

O Rodrigo Tosta sugeriu que continuasse a seguir a planilha no que fosse possível e procurasse aulas de deep running para substituir a corrida.

Fui atrás, mas são pouquissimos lugares em São Paulo que tem instalações e profissionais especializados.

Felizmente achei o Fabiano Bispo na AREA, que fica na Pamplona e relativamente perto do metrô. Foi praticamente um personal, pois mesmo quando ele sabia que só haveria eu na aula, nunca deixou de ir. Trabalhava os aspectos técnicos do deep, puxava os treinos para o ritmo não cair e sempre me cobrava para estar presente na próxima sessão de treinos.

Incorporei a corrida na piscina durante a hora do almoço três dias durante a semana e um "longão" de suas horas aos sábados.

Fora isso, duas sessões semanais de fisioterapia para a acelerar a cicatrização, fazer alongamento e fortalecimento.

Resolvido? Não.

Quando as coisas dão para dar errado, é uma noticia ruim atrás da outra: voltei a sofrer com lombalgia.

Em certos dias, não conseguia mais fazer os treinos de pedal - mas por medo de forçar e ter um agravamento da dor, já que na bike até que me sentia bem.

E lá fui eu atrás de horários de um quiroprático por sugestão da Cintia Tobar e indicação do Chico.

E estressa, né? Quando você tem que lidar com tantos "encaixes" de horário, trabalhar e treinar. Passei esse mês pra lá e pra cá com uma rotina insana.

Mas, enfim, isso tudo faz parte desse "estilo de vida", embora a gente só use essa expressão para falar das coisas positivas....

As vezes, não é bem assim. As vezes, a gente se machuca.

Mas tem uma lição nisso tudo - eu tinha me esquecido como fazer uma prova de meio-ironman é um esforço pra lá de trivial.

Porque depois de várias provas dessa distância procurando fazer o melhor tempo, quando não estamos bem temos a tendência de dizer "Ah, eu só vou lá para completar".

What? Como assim, "só para completar"??????

Alguém acha pouco passar em torno de seis horas nadandopedalandoecorrendo só porque fez isso mais de uma vez?

Acho que muitos de nós (e ninguém em particular, diga-se) perdemos um pouco a dimensão das coisas.

Esse período mais complicado serviu para me colocar novamente no meu devido lugar e pensar que sempre, sempre a maior dificuldade é conseguir treinar para estar na largada e, em segundo, completar a prova.

A partir disso tudo, pelo menos conseguirei estar na linha de largada.

Minha luta terá três rounds.

No primeiro, vou tentar uma natação forte para os primeiros 300 metros e atacar novamente perto das bóias. Ainda que seja desconfortável e me arrisque a morrer afogado na praia, o Rodrigo diz que será um aprendizado para no futuro nadar mais forte.

Quando soar o gongo do final do primeiro assalto, vou acelerar a transição para algo em torno de dois minutos, mesmo correndo o risco de sair para o segundo round meio afogado.

No segundo vou pedalar. Mesmo se estiver sem dores lombares e com as pernas fortes, vai ser complicado fazer algo além de um esforço moderado. Meu último treino no rolo hoje, três dias antes da prova, me deixou bastante desanimado - minha capacidade aeróbica deixa a desejar.

No terceiro e último assalto, a estratégia é correr sem sentir dor. Se sentir dor em função do esforço, vou administrar.

Mas se isso acontecer no mesmo local onde tive a lesão, entrego a corrida e a prova.

Vai ser duro, vou ficar arrasado e querer pegar o primeiro voo direto pra casa...

Mas não vou comprometer o ano, que ainda tem mais um prova legal.

Agora, são expectativas.

E "expectativa" é aquilo, né? Serve pra nada...

Lembro que em 2009, meu primeiro Iron, treinei, treinei...Deus do céu, como treinei.

Cheguei na praia as 6:30, a lua no céu e sol para despontar. O mar calmo, uma brisa tranquila e uma paz interna muito grande. Minha confiança lá em cima.

Pensei "Hoje tudo vai dar certo, com certeza. Estou sentindo que hoje é o meu dia..."

(por um triz, mas por um triz não disse "hoje o universo conspira a meu favor".)

Dada a largada....

Tropecei, cai, levei um soco no rosto, entrou água no óculos, o wetsuit começou a sangrar meu pescoço, tomei um chute no estômago na primeira bóia, depois ninguém encontrava a segunda porque ela se soltou. Me perdi no mar e quando me achei, tive que voltar para contorna-lá, pois já havia passado do ponto.

No pedal, as marchas subiam e desciam aleatóriamente, pois o coroão estava retorcido. Nas subidas, não conseguia mudar as marchar e fiz todas no prato maior, com um ritmo mais ou menos assim:

uuuuuummmmm.............doooooissssssss....................uuuuuuuummmmm..........dooooooisssssssss

E morrendo de medo da corrente não aguentar.

Quando finalmente acabei os 180k minha lombar estava toda travada.

A corrida foi "sopa". O cinto de hidratação, que nunca deu problema, não parava quieto. Primeiro, ficava caindo no meu joelho. Joguei algumas coisas fora para aliviar o peso. Mas ai ele começou: virava para a esquerda, virava para a direita. Teve uma hora que pensei que enroscado um bambolê na cintura.

Esse negócio de expectativa, viu....:-))))))

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Back to Basics?

Dizer que o triathlon é um "estilo de vida" é uma coisa que parece um tanto inusitada quando você está conversando com alguém que não é familiarizado com o tema.

Embora seja possível reconhecer pessoas que praticam certos esportes em função de traços físicos e hábitos culturais, o que inclui um gosto musical particular ou por um certo jeito de se vestir, acho que ninguém diz que pratica futebol, corre, joga vôlei, basquete ou...sei lá, golfe, enfim, ninguém pelo menos que eu conheço diz que seu esporte preferido é um "estilo de vida".

Conversando com a Lisandra no Chile e contando sobre meu desejo de um dia poder fazer o Ultra Trail Du Mont Blanc, ela me chamou a atenção para o fato dos corredores de montanha serem talhados fisicamente pelo esporte que escolheram e pelo meio em que vivem - os olhos profundos, a pele grossa imune ao frio, os rostos envelhecidos e a expressão vigorosa. Pernas enormes. Uma relação quase metafísica com as alturas e a natureza.

O "estilo de vida" desses corredores emerge de uma emersão completa na vida cultural.

Para eles, vencer as distâncias tem um significado maior. "It's not about Running", parafraseando o Armstrong.

Fico me perguntando: o triathlon não seria algo mais que "nadarpedalarecorrer" também?

As vezes, fico pessimista quando percebo que nosso "estilo de vida" pode ser apenas uma ilusão construída por um padrão de consumo baseado na ostentação e sem valores comuns, cujo resultado é aquela imagem caricata dos "triatletas de boutique" - figura que se empeteca com um capacete aero, óculo oakley, macaquinho 2xu e monta em sua bike cérvello para ir na padaria.

Eu não sei. Recentemente vi uma discussão totalmente insana entre uma triatleta que fez uma prova insana e um sujeito insano que disse palavras insanas e ouviu coisas insanas de quatrocentas outras pessoas....bem, advinhem!

Insanas...

As pessoas desaprenderam a expressar solidariedade ou é impressão minha?

E, depois, ficam "sensibilizadas"com o Dick e o Rick Hot?

Claro, não sejamos inocentes - isso acontece também em outras esferas da vida e os triatletas não estão fora de um contexto social mais amplo.

Reconheço também que em outros esportes o mesmo ocorre de forma tão ou mais truculenta.

Só que não adianta. Julgar o defeitos dos outros por meio dos nossos próprios defeitos é um péssimo argumento.

Já assumindo meu erro por ser tão genérico e injusto em querer julgar um mundo de gente que não se encaixa nesse perfil que tracei, gostaria de perguntar: esse nosso esporte não deveria agregar a vida das pessoas, além de hábitos saudáveis, valores que as tornassem minimamente cordiais?

Acho que antes de pensar em suplementos, bikes, capacetes, o preço das provas, pneus clincher ou tubular, descanso ativo etc etc etc, poderíamos nos perguntar "quando aqueles caras criaram o Ironman, o que eles queriam provar mesmo?"

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Treino preferido

"O sertão é dentro da gente. E esse sertão não é feito apenas de aridez e provocação, mas também de veredas, de estações de alívio e beleza em meio à solidão."

Guimarães Rosa


O Kiko viu em uma entrevista da Vanessa Gianinni na Trisport e lá pelas tantas a ela é perguntado sobre "treino favorito".

Inspirado nessa pergunta, resolveu contar sobre o dele no seu Blog.

Vou puxar esse fio porque ele, ao se referir ao filme "127 Hours", fala sobre a solidão.

Eu tenho umas esquisitices pois, em um meio em que a maioria das pessoas curte treinar em grupo, gosto mesmo é de ficar só.

Porque uma das coisas complicadas de quem mora sozinho é achar um tempo para ficar realmente sozinho.

"Sozinho com o sozinho"

Não, você não entendeu mal. Na era da hiper-super-mega conexão você nunca está realmente só.

Antes, você comprava um "telefone". Agora tudo é "ACESSO". Você olha as pessoas em lugares públicos quase em estado hipnótico, digitando para uma rede em que na outra ponta está alguém que por sua vez está escrevendo para outra pessoa em um circuito infernal de MSNs.

Por isso, meu treino preferido não tem grandes paisagens ou acontece em lugares bacanas. Meu treino preferido é um ir e vir no meu bairro para ir nadar, onde resolvo minhas inquietações (ou crio outras).

Um dia o Xampa se perguntava como as pessoas conseguem realizar certas tarefas para um Ironman, tal como passar seis horas em uma bike.

No meu caso, acho que não seria totalmente errado responder que os esportes de endurance, mesmo quando extenuantes fisica e mentalmente, fazem parte do rol de fatores que me ajudam trabalhar melhor com a ansiedade.

Tenho uma dificuldade enorme para achar um certo equilíbrio em meio a tantas coisas pessoais e profissionais ocorrendo ao mesmo tempo. Por me comprometer demais, as vezes me sinto como aquele sujeito que equilibra prato chinês: coloco vários deles girando em cima de varas, umas muito distantes das outras, e depois fico correndo de um lado para outro para que não caiam.

Mas quando estou realmente sozinho parece que os pratos giram muito lentamente e, como em um sonho, posso andar entre eles sem precisar tocá-los.

As vezes aproveito para derrubar alguns, porque o motivo que me faz girá-los nem existe mais.

Levanto cedo, as 4:30 da manhã, para ir nadar três vezes por semana. Tomo uns birinights (essa mania de falar giria da terceira idade não me deixa!) e uma banana com mel.

A academia abre as seis. Então volto para a cama e como a manhã é o meu melhor período de concentração, pego aleatóriamente algo para ler, mas invariavelmente uma história inspiradora nos esportes de endurance ou uma das várias revistas de triathlon que tenho guardadas para revisitar.

São 45 minutos em que penso simplesmente no que estou lendo, da forma mais despretensiosa possível. Não tenho que fazer uma resenha, anotar nada e muito menos polemizar.

Depois, levanto, visto tudo muito rapidamente e vou para a academia nadar. São mais ou menos 20 minutos de caminhada e escolho o percurso mais demorado de forma proposital - gosto apenas de ir caminhando...

O céu escuro vai ficando azul. O ar da respiração fica visível ao se condensar. Algumas poucas pessoas estão correndo no canteiro central da Brás Leme e outras vão com passadas rápidas para o trabalho. Tem o pessoal do ponto de ônibus, tem o pessoal que fica no posto de gasolina.

Chego na academia, brinco com o rapaz que guarda o material no vestiário e vou para a piscina. As vezes, sou o primeiro a chegar. Fico de pé na borda e fico feliz só de ver a sala com uma espécie de névoa e o vapor cobrindo a água quente.

Entro devagar na água, dou as primeiras braçadas. Nado fácil, descansado. Depois vou despertando na água quase morna...

Para mim, é como um lago no topo do mundo.