Sempre achei que o fato de raramente ter sofrido alguma lesão é um ponto que me favorece bastante. Além de permitir que eu participe de provas dentro de pequenos intervalos de tempo, consigo também sustentar uma rotina de treinamento que me ajuda a me manter apto para essas mesmas provas.
Mas desta vez foi diferente.
Três dias depois da prova de Caiobá, justamente no dia que deveria voltar as treinos, depois de um dia de incômodo com a minha cadeira no trabalho, cheguei em casa e me "esparremei no sofá" antes de ir correr.
Mas, ao tentar levantar, uma dor aguda na lombar. Como uma faca quente entrando pelas costas. Mal consegui andar.
Forcei um pouco e os espamos cederam. Cederam um pouco. Apenas o suficiente para eu andar pelo apartamento.
Crente que sou invencível, achei que tinha sido mal jeito. Ainda que "um senhor" mal jeito...
Tentei nadar no outro dia. Mas os espamos estavam lá e me fizeram abortar o treino na metade.
Conversei com o Presidente, que estava na academia fazendo o treino de bike indoor. Ele tem uma certa experiência com essas dores e, depois de algumas perguntas, me disse que, pelo jeito, seria uma questão "muscular".
Engraçado que ele disse "muscular", como se não fosse grave ou algo para me preocupar muito.
Depois, lendo sobre o assunto, entendi o que ele quis dizer - dores nas costas podem se tornar um problema crônico em certos indivíduos e chegam a alterar o comportamento social das pessoas.
Uma lombalgia muscular, por outro lado, é um problema passageiro e costuma cessar entre sete e dez dias de repouso e medicação baseada apenas em antiinflamatório.
Mamão com açucar.
E foi exatamente isso que o médico me disse naquela mesma manhã, quando procurei um ortopedista para ter uma avaliação urgente do meu problema. No meu caso, não houve sequer inflamação do ciático.
Ele nem se deu ao trabalho de pedir exames.
Mas passa pela cabeça de alguém ficar "em repouso" 45 dias antes de uma prova como o Iron, justamente quando começam os treinos com maior volume?
Foi isso, e não exatamente a lesão, que me deixou bastante apreensivo. Em certos momentos, perdi completamente a perspectiva em relação a dimensão real desse problema.
Chega a ser engraçado.
O médico me pediu sete dias, mas ao tomar o primeiro comprimido, eu pensava "Cáspita, ainda não aconteceu nada...será que não vai melhorar nunca ?????"
Bem, isso apenas 15 minutos depois da primeira dose....
A dimensão psicológica do problema foi o ponto que o Rodrigo atacou de primeira. Relatei tudo para ele por e-mail.
E ele me respondeu "calma".
Calma?
No segundo dia, pensava que o IM de Florianópolis já era e que deveria pensar em Cozumel. No terceiro, na possibilidade de me tornar um inválido e, no quarto, já me via em uma cadeira de rodas.
O Rodrigo, coitado, repetia "caaaaalmaaaa".
As dores agudas me colocavam "na defensiva", andando devagar ou me forçando a fazer pequenos movimentos de forma reticente. A lombar estava tão sensível naquele momento que andava na rua com receio que alguém me empurrasse pelas costas.
Até minha respiração tinha mudado.
Mas no quinto dia, cessaram.
No sexto, comecei a fazer acupuntura com a Silvia, uma amiga de anos e anos que eu não via a muito, mas que gentilmente me atendeu de imediato.
A partir dai a melhora foi exponencial.
Mas meu medo ainda estava lá.
Eu precisava vencer a relutância psicológica para voltar a nadar, correr e, principalmente, pedalar.
Exatamente seis dias depois das primeiras dores e um dia depois da acupuntura, nadei 3k com palmar e pulbóia.
Nada aconteceu. Depois das primeiras braçadas, minha confiança voltou e fiz o treino nadando de forma ritmada, entre moderado e moderado/forte.
No primeiro teste, eu tinha passado.
No outro dia, na quarta-feira, seria o dia correr. Fiz 1:45, correndo 45 fácil, 45 moderado e 15 fácil.
A musculatura da lombar estava apenas dolorida. Entretanto, nada de espasmos.
Mais acupuntura no mesmo dia.
Decidi que era hora de encarar um treino no rolo. Me programei para fazer isso na quinta pela manhã.
Nesse dia, ainda pela manhã, subi na bike e deixei o pedal leve para tentar duas horas de rolo sem forçar, assistindo um incrível show do Band of Joy, banda recém formada pelo cada vez melhor Robert Plant.
Fiz todos os movimentos possíveis e, mesmo ao me debruçar sobre o clip, nada senti.
Sexta-feira, um estímulo mais difícil: encarar as subidas e fazer força no Riacho Grande. Ainda com certo medo, subi na bike cuidadosamente e comecei a pedalar no volantinho para, depois, subir a marcha no volantão para me testar.
Consegui 90 km em 3:10 minutos. Uma média de quase 30 km/hora sem parada.
Ótimo! Fiquei realmente feliz!!!!!
No mesmo dia, fui para a acupuntura e, além da acupuntura, a Silvia ainda me aplicou uma massagem.
Sai de lá bastante confiante. Notava que minha postura já era a de uma pessoa mais tranquila.
No sábado, que tal fazer o treino da planilha que estava programado para domingo?
Pensava que domingo, pegar a Anchieta para voltar do Riacho Grande, seria um stress que eu não merecia.
Foram 4:30 de bike e 5 km de corrida. A dor tinha sumido completamente.
Só que senti o esforço e o sol me deixou com um pouco de insolação. Confesso que a hidratação também não foi das melhores.
Mas que alívio! Nenhuma dor na lombar!
No domingo, fui correr uma hora só para não passar o feriado em branco.
Ainda terei certos cuidados na semana que se inicia agora. A acupuntura não para.
Mas a perspectiva mudou completamente. Estou novamente inteiro para treinar.
Não sei os impactos dessa semana "perdida" no resultado que vou colher no dia 29 de maio. Me coloquei a disposição do Rodrigo para fazer treinos especiais, mesmo nos dias da semana.
Ele, entretanto, disse que isso não seria necessário e que não havia porque mudar a programação.
Vamos ser sinceros? Quando você vê pessoas que vão para Florianópolis fazendo dezenas (ou centenas) de quilômetros nos longos de final de semana, como não achar que quase dez dias parado foram fatais para uma boa prova em Floripa?
Não seria o caso de correr atrás do prejuízo?????
NÃO, NÃO, NÃÃÃÃOOOOOO
Por dois motivos.
Primeiro, porque o Ministério da Educação informa que "Correr atrás do prejuízo" faz mal para o uso correto da língua portuguesa.
Nem como licença (anti) poética.
Pois isso não existe!!! Faz sentido alguém "correr atrás de prejuízo"????? :-(((((
O segundo é a estratégia do Rodrigo. Simplesmente confio no que ele me diz.
Nessa "crise" recente, ele soube lidar com a minha ansiedade de tal forma que, nos dias mais críticos, me apoiei mais na confiança dele em mim do que na minha própria.
E isso me faz refletir um pouco sobre o papel dos nossos técnicos.
Infelizmente, quando leio alguns posts de amigos que estão treinando forte para o Iron, noto que as coisas não estão dando certo. Se não para todos, pelo menos para alguns.
No meu entender, há uma ansiedade desnecessária gerada por "quebras"em treinos fortes e resultados "ruins" em provas recentes.
Essas frustações geram comparações indevidas e o desânimo contamina a seqüência de treinos.
O resultado é que as profecias negativas podem acabar por se auto-realizar.
E, não, não estamos falando de pessoas que estão fazendo seu primeiro Iron.
Estou falando de gente experiente, da maior categoria que, nos age groups, querem mais que simplesmente terminar a prova.
Como entender e lidar com a subjetividade humana é uma "arte" que nem todos os coachs dominam.
Porque elas tem tem origem em questões pessoais, decorrentes da história de vida de cada um.
Elas não estão na sua planilha.
Como diz o personagem do Morgan Freeman no filme "Menina de Ouro".
“(...) It’s the magic of fighting battles beyond endurance. It’s the magic of risking everything for a dream that nobody sees but you.”