Toda vez que a gente comenta uma prova (sobretudo se o resultado não é o esperado), é batata: o mar estava grande, muito vento na bike, a corrida estava muito quente com o sol a pino e blá, blá, blá....
É sempre um drama.
E quando os dramas se aglomeram na linha chegada ou na área de dispersão, parece que aqueles caras com roupa apertada voltaram algum lugar que rolou uma hecatombe que só você, que foi lá para assistir, não viu.
Então, desconto dado para os exageros de sempre, de fato vou dizer o seguinte: Pirassunga machuca.
Essa foto do Ciro e o relato dele sobre Pirassununga são bastante emblemáticos sobre o que foi essa prova (e olha que eu acho esse cara o melhor triatleta do Brasil)
Se a prova não te enche de dores musculares e bolhas nos pés, o calor extremo pode te dar enjôo ou tontura ou deixá-lo mentalmente exausto muito antes do final. O sol direto na sua pele pode gerar queimaduras e, conseqüentemente, febre a noite.
Não tenho dúvidas que a minha terceira participação foi a mais difícil. Meu "pior" resultado lá foi esse ano: 5:28. Mas também considero que foi a melhor prova que já fiz em termos de superação.
Porque, como diz o Vinícius, cada prova tem sua história. Os resultados são relativos e comparações devem ser sempre muito bem pensadas. Diferenças de poucos minutos são insignificantes e traduzem coisas diferentes a cada ano.
Em Pira 2010 o nível de dificuldade foi muito maior que em 2008 e 2009. Além do mais, estou mais velho. Isso é um dado que não posso ignorar. Para quem leu o bom (e apenas bom) "Do que eu falo quando eu falo de corrida", de Hakuri Murakami, sabe que a partir de uma determinada fase, a luta não é para baixar os tempos, mas resistir o máximo possível....
E foi essa minha meta esse ano. Não deixar meu tempo cair para 5:30.
Depois do Long Distance de Caiobá em abril, do Iron em maio, do 70.3 em Penha em agosto, a Ultra Bertioga-Maresias em outubro, você pode pensar que tudo isso influiu na minha queda de rendimento.
Seria cômodo para eu dizer isso. Mas não vou fazê-lo. Porque não é verdade.
Apesar dessas provas todas, não senti esse ano, em qualquer momento, o cansaço acumulado. Não me senti esgotado física ou mentalmente. Todas as provas curti e fiz com prazer, sem deixar de fazer o melhor que posso.
Meu problema são minhas deficiências de sempre. E cada vez tenho que treinar mais para que a bola caia menos.
Bom, mas e a prova?
Todo sabe que no triathlon a prova começa por um bom planejamento. Quando se trata de um triathlon de endurance, nem se fala....
Ai já comecei mal. Fui para Pira deixando na geladeira parte dos frascos de pedialite, além do estomazil, que deveria usar para fazer o composto que iria tomar durante a prova.
Outra coisa. Fiz a reserva do Hotel na última hora. Pior: cheguei lá, a reserva não estava confirmada.
Resultado, fui parar em um quarto nos fundos, ao lado de uma avenida que dava para o maior hipermercado de Leme. As janelas não eram a prova de ruído. O banheiro, bem...você já se hospedou em algum banheiro com "rodo"?
Sim, rodo...rodo, aquele...rodo de puxar água!
O meu, tinha. Como não havia cortina ou box, o troço estava ali para o hospede puxar a água e não deixá-la ir para o quarto. Digamos que aquilo seria uma espécie de "auto-serviço", se é que vocês me entendem...
Mais: lá pelas tantas, depois do banho, quando usei o banheiro e fui ver, o papel higiênico parecia aquelas bolatas ensopadas que a gente fazia na escola para jogar no teto da sala.
E, finalmente, vi apenas um toalha e não havia espelho.
Bom, mas eu não esquento com isso, não. Uma das coisas que eu aprendi nessas situações é que a prova em si já é estressante o suficiente e o negócio é se virar...
Preparei as gororobas que o Mario, meu nutricionista, me recomendou e fui dormir. Ou tentar....
Levantei as 5:00, tomei banho e comecei a me hidratar. Além disso, já passei a primeira mão de protetor solar - principalmente porque tinha esquecido de levar a camisa de manga longa da 2XU, que é apropriada para evitar os queimaduras provocadas pelos raios solares e ainda mantém a temperatura corporal.
Fui para a Base Aérea, estacionei o carro tranquilo e já encontrei a Cintia, que eu não via desde do Iron. A gente bateu um papo, demos muitas risadas e fui levar minha bike para a transição. Tudo normal (claro: fora tudo que esqueci, depois de conferir "tudo" antes de sair de casa....).
A natação começou tranquila e sem os atropelos como ano passado. Sai bem no canto e fui tentando achar meu ritmo, já que não sou daqueles aptos para dar um tiro forte e depois entrar em velocidade de cruzeiro.
Depois de emparelhar com um sujeito que não me deixava passar, pensei "porque diabos eu vou ficar aqui fazendo força se eu não tenho braço suficiente para passar e deixar esse sujeito para trás?".
Não deu outra: peguei a esteira! Como a água estava ótima, eu conseguia ver os pés da pessoa que seguia na minha frente. Quando chegou uma menina, troquei de carona. Foi ótimo! Lembrei de um comentário que li no Blog da Talita Saab, quando ela dizia que muitas a primeira coisa que ela mira é a esteira de alguém da elite e tenta não perder esse lugar de jeito nenhum.
Bom, foi o que eu fiz. Ou tentei....
Pelo menos até um cara de 800 quilos tomar o meu lugar...e não dava para discutir o assunto com o rapaz, que foi chegando, foi chegando, foi chegando....quando fui ver, já era!
Mas acho que fui um pouco preguiçoso. Quando dei por mim, realmente nadei sem esforço. Meus braços sempre dóem, mas desta vez não senti nada. Fiz esforço apenas nos últimos 500 metros. Não sei meu tempo na natação e estou curioso para ver o resultado disso tudo.
Sai da água inteiro. Fui pegar minha bike e minha sapatilha, que eu tinha arrumado na noite anterior, estava com com o laço muito apertado. Ai coloquei, tirei, coloquei de novo, tirei....enfim, perdi alguns minutos ali - mas isso também não me chateia.
Na bike, sai para pedalar na boa. Muita gente "espertinha", mas sem prática, toma tombos bestas porque deixa a sapatilha clipada na bike. Só que o início é uma pequena subida. Ai o fulano se embanana todo eeeeee...pumba!
Acho que esse ano não teve muito vento - pelo menos não como ano passado. Também não vi muitos pelotões - mas, como já comentaram por ai, quem está dentro da prova não vê nada do que se passa. E, segundo o Kleber Corrêa, pelotões, pelotões e mais pelotões....
Tentei fazer uma média para 34 km/hora, mas faltou força e cai para 33,2 km/hora no final. Considero esse resultado bom porque, em primeiro lugar, andar a mais de 33 km/hora em 90 km não é bolinho, não (o problema é que para os padrões do triathlon, essa média não é lá essas coisas...né Artur???? ;-))).
Em segundo, depois de Penha, eu apenas pedalei na rua uma única vez. O resto foi treino no rolo.
Foi na bike que comecei a me hidratar com uma gororoba que o Mário recomendou. Só que ele tinha indicado que eu colocasse, junto, estomazil - que eu tinha esquecido.
Resultado: aquilo era tão porreta que eu não sentia nem necessidade de comer. Só que meu estômago foi "inchando", ficando cada vez mais pesado.
Fechei a bike. Minha cadência média foi de 73 rpms. Baixa, não? Você pode pensar: esse cara fez muita força e vai sair para correr com a musculatura travada.
Nada disso. Sai para correr com as pernas completamente soltas.
Eu não entendo isso e já desisti de tentar. Mas quem quiser explicações detalhadas, escreve para o Vinicius. Depois me escreve e me explica, ok? ;-))))
O meu único problema continuava a ser o estômago. Eu não comi nada durante a bike e não conseguia tomar gel na corrida. Hidratar também não estava fácil.
Mas nada de diarréia ou coisa do gênero. Só aquele incômodo...
Aiaiaiai...cadê aquele estomazil????
Apesar de tudo, minha corrida foi, como sempre digo, execução de passada. Eu tento dar 90 passadas por minuto e boas! Não faço força - aliás, acho isso até um defeito meu. No fundo, quero evitar a dor do esforço...
Quando vejo os caras da elite ou os melhores amadores me passando nessas provas, gemendo e arfando com dificuldade, completamente ensopados e quebrados (sim, os caras correm quebrados e ainda assim conseguem tempos excepcionais) sinto que esse esporte que escolhi para fazer na vida é uma coisa que, antes de tudo, dói!
E você sabe que vai passar pelo mesmo na prova, só que um pouco mais a frente!
Bem, feita a primeira perna dos 21k com relativa tranquilidade, na segunda o sol veio e ficou a pino.
A sensação de incômodo foi passando, tanto que ensaiei uma aceleração, imaginando que eu era o Craig Alexander (levanta a mão quem nunca já fez prova de ciclismo e no pedal se imaginou o Lance Armstrong! Cáspita, tem gente que faz isso em aula de spinning, ué!).
Me senti bem enquanto a pilha durou, pois o Craig Alexander incorporou um pouco cedo demais. Antes de sair daquele inferno que é o trecho de terra, quebrei. Claramente, quebrei.
Minha sorte é que eu sou quebrado por natureza e correr assim não me é estranho. ;-)))
Só que eu não fico repetindo "a dor é passageira, mas a derrota é eterna" porque isso ai é dessas coisas inúteis que me irrita só de pensar....
Porque se você não treina correr cansado meu chapa, não tem frase de efeito ou pensamento positivo que vai te salvar na hora "H". Você tem que confiar muito mais nas suas pernas do que na sua cabeça...
Vai por mim! Pára de assistir os vídeos do Armstrong no Youtube e vai treinar....
Bom, fui executando cada passada, tentando não pensar no final. Mas no último quilômetro meu estômago piorou e fiquei com muita vontade de vomitar. Foi por pouco....
Na chegada, depois de cruzar a linha e corri para a sombra. Joguei-me no chão e senti a pressão despencar. Não conseguia beber nada, muito menos comer - mas a sede e fome eram infernais!
Fui para enfermaria e o pessoal tirou minha pressão - estava 9 por 7. Como não entendo nada disso, não sabia se isso era bom ou ruim. Mas pela cara deles, logo descobri que pelo menos bom não era....
Tomei um comprimido para conter o enjôo. O efeito foi instantâneo e melhorei na hora. Comecei a me hidratar e ver o pessoal no final...A grande maioria dentro das banheiras, jogando água fria no corpo ou sentada em sacos de gelo...
Para mim, as consequências foram duras: queimaduras de sol, febre durante a noite, bolhas no pé (que estou drenando nesse momento, um pouco preocupado com uma possível infecção) e 5 quilos a menos.
Por último, não dá para não falar dos amigos.
Encontrei com o Paulo, Artur, Sandro, Negão, Flávio, Marcão, Dalton, Mota, e tantos outros que me foram apresentados e que não conhecia, com o Nelson e o Marcos, que vão para Pucón e a gente combinou de se encontrar por lá...
Da comunidade do Orkut, vai um abraço para "os manú":
O Luiz Gustavo, que não fez prova, deu uma força para todo mundo que podia! O que esse menino nadou, correu...ele só não fez o pedal! Tudo para ajudar os amigos e o irmão que estava fazendo a prova!
Já o Luiz (Rofi) me deu aquela moral no começo dos 21k - eu não estava muito bem, aquela fase difícil da transição bike-corrida, quando o seu corpo está se adaptando. Ele me viu e correu do meu lado para incentivar! Putz, super obrigado!!!!
Aliás, o mesmo fez o Kleber, que foi para lá para auxiliar o pessoal da 5ways e também prestigiou todo mundo. Aliás, até brinquei no twitter, dizendo que o cara é tão fera que ele correu do meu lado (de havaiana) uns 100 metros fazendo o pace e já foi o suficiente para eu buscar um encardido que eu não pegava de jeito nenhum! (rs)
O Rodrigo correndo ao lado da Ariane foi um espetáculo a parte! Passada larga, consistente, concentrado. É uma coisa impressionante! E, olha, mesmo assim, não deixou de dar um alô quando nos cruzamos!
Bom, para fechar, como escrevi no facebook, em Pira a gente não se cumprimenta porque terminou a prova, mas porque sobreviveu a ela.